(Autor: Bispo José Ildo Swartele de Mello)
A relação da Grande Comissão com o Espírito de Deus é explícita. Não apenas em Atos 1 e 2, mas também vemos isto em outras passagens como, por exemplo, em João 20.19.23, onde Jesus diz “recebam o Espírito Santo” e em seguida comunica a missão. O mesmo se pode ver em Lc 24.47-49. O capítulo primeiro de Atos introduz o tema do Espírito Santo em estreita relação com tudo que vai acontecer no decorrer da história da Igreja. O Espírito Santo é a coluna vertebral de todo o Livro de Atos.
Sabemos que Lucas é o autor tanto do Evangelho de Lucas como também do Livro de Atos. Ele começa o livro de Atos dizendo: “Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar até ao dia em que, depois de haver dado mandamentos por intermédio do Espírito Santo aos apóstolos que escolhera, foi elevado às alturas” (At 1.1-2). Ao dizer “começou”, Lucas certamente quer comunicar que existe agora uma continuidade da obra de Cristo na missão da Igreja pelo poder do Espírito Santo. A intenção de Deus é de que tudo o que a Igreja venha a fazer seja a continuação da obra de Jesus e isto só é possível através da capacitação do Espírito. É uma promessa mais que um mandamento, quando vier o Espírito Santo, vocês receberão poder (At 1.8). Poder para ir as nações e poder transformador que atua na história. Missão do Espírito e da Igreja se dá nesta era que vai da primeira a Segunda Vinda de Cristo.
Ainda no capítulo primeiro de Atos, temos a questão a respeito de quando se daria a restauração do Reino da Israel. Falar em reino é também falar em poder. Observe, então, que a resposta de Jesus aponta para o fato de que eles receberiam poder por obra do Espírito Santo e que assim que se daria a manifestação do Reino de Deus, que não apenas se restringiria a nação de Israel, mas que teria um alcance muito mais amplo, envolvendo todas as nações. Pois Jesus não veio para ser apenas o Rei de Israel, mas para ser o Rei de todas as nações (Jr 10.7; Ap 15.3). Vemos o propósito universal do Reino de Deus e da missão da Igreja também no dia de Pentecostes, no fato da ação do Espírito promover a conversão de uma multidão proveniente de várias partes do mundo. Tem algo muito interessante no fato do fenômeno que se deu, a reverso de Babel, quando ali, pessoas de distintas nacionalidades, estavam podendo entender a mensagem do Evangelho cada um em sua própria língua materna. O que foi um claro sinal dos tempos, pois se em Babel, houve a confusão de línguas e a dispersão dos povos, em Pentecostes, por meio do Espírito, se dá o contrário, pessoas de distintas nações estão sendo unidas e batizadas na Igreja, formando um só povo que se submete ao senhorio do Rei das Nações (At 2.1s).
O derramamento do Espírito em Pentecoste ocorreu imediatamente após a ascensão de Cristo e é inseparável dela. Jesus foi entronizado como Senhor e Messias (At 2.36), como o Rei de todo o Universo, e é desta posição que ele enviou o seu Espírito para capacitar a sua Igreja a cumprir sua missão de fazer discípulos de todas as nações.i
O Espírito Santo é a fonte da Missão da Igreja. Em Pentecostes, vemos como o Espírito conduz os discípulos para fora do cenáculo para proclamação do Evangelho. O início da evangelização dos gentios é de total iniciativa do Espírito Santo tanto no caso do Etíope (At 8.29) como no de Cornélio (At 10.19s). Os primeiros versos do capítulo 8 de Atos mostram como a grande perseguição sofrida pela Igreja em Jerusalém tornou possível a difusão do Evangelho. E, em Atos 11.19-21, temos o registro de como os discípulos alcançaram outros lugares do mundo, chegando o Evangelho até os gentios em Antioquia. E Rm 15.24-28 revela os planos de Paulo de levar o Evangelho até os confins do mundo conhecido por ele, a saber, a Espanha. Em Atos 16.6-13, vemos os discípulos são impedidos pelo Espírito a pregarem a Palavra na Ásia, e depois são conduzidos por uma visão do Espírito para a Macedônia. Vemos aí que o Espírito Santo não dava apenas poder para a missão, mas dava também a direção. Em At 13, vemos que tanto o envio para missão como também a escolha dos líderes era obra do Espírito Santo. E, em At 15, temos o registro do maior problema teológico da Igreja primitiva que foi aquele que dizia respeito ao relacionamento dos judeus com gentios. O próprio Pedro custou a entender que os gentios estavam incluídos no propósito de Deus como vimos no episódio da evangelização de Cornélio e sua família. Assim, vimos que foi o Espírito Santo quem iniciou a Missão (At 13.2), guiou a Missão (8.29, 16.9) e é quem trabalha nos corações preparando-os para a recepção do Evangelho (At 16.14; Jo 16.8). E os próprias virtudes, realizações, dons, sinais e maravilhas são todos obras do Santo Espírito de Deus na vida do crente e da Igreja (Gl 5, 1 Co 12-14, At 2), a fim de que possamos ser uma ilustração viva da realidade do Reino de Deus, que tem o Jesus como Rei, Senhor e Cabeça.
Até mesmo em coisas corriqueiras, como, por exemplo, a dificuldade administrativa na distribuição diária de alimentos para os necessitados (At 6.1s.). Como resposta a este problema, foram eleitos 7 diáconos que precisavam, para isto, possuir mais do que aptidões técnicas, necessitavam ser cheios do Espírito Santo (6.3).
Como já vimos no estudo que fizemos sobre a natureza do Reino de Deus na era presente. Jesus exerce o seu senhorio através da ação do Espírito Santo. Como Deus disse em Zacarias 4.6: “Não por força nem por poder, mas pelo meu Espírito”. Não é a soberania de um monarca arbitrário, mas a de um Messias ou Rei crucificado. É pelo Espírito de Deus que as pessoas recebem a revelação de que Jesus é o Senhor (1 Co 12.2), assim como foi por revelação do Espírito que Pedro foi capaz de confessar: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo” (Mt 16.16, Rm 8.16). Cristo significa o Rei Ungido de Deus, o Messias que fora prometido a Israel, que viria com a incumbência de trazer o Reino de Deus (Jo 11.27).
Existe um paralelo entre o fruto do Espírito Santo registrado em Gálatas 5 com as bem-aventuranças descritas por Jesus em seu Sermão do Monte, pois ambos são uma descrição do caráter de Cristo, que devem também modelar o caráter cristão. A maior obra do Espírito é transformar cada cristão na imagem de Cristo, para que sirvam ao propósito de refletir a glória de Deus na sociedade. O Espírito de Deus está ativo para criar uma Igreja que reflete os valores do reino. A Igreja não cumpre sua missão apenas pelo que diz, mas pelo que faz, como decorrência natural do que ela é e de sua relação com o Senhor. Pelo poder e graça do Espírito Santo a Igreja é capacitada a cumprir sua missão de ser testemunha do Rei Jesus e de ser sal da terra e luz do mundo, fermento que leveda a massa.
i Padilla, René C. y Yamamori, Tetsunao, editores. La iglesia local como agente de transformación. Uma eclesiologia para la missión integral. Buenos Aires: Kairós. 2003. P. 36.
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