As Etapas da Vida Ministerial: Uma Jornada de Sabedoria e Discernimento
Palestra do Pr. Ziel Machado no Encontro de Pastores Metodistas Livres da Grande São Paulo, realizado na IMeL Mirandópolis em 7 de junho de 2025.
Introdução: Uma Trajetória de 44 Anos
Queridos irmãos e irmãs, graça e paz. O tema que vamos conversar é sobre as etapas, as diferentes etapas na vida ministerial.
É uma alegria muito grande estar com vocês aqui. O que eu quero compartilhar é um pouco das lições da minha trajetória. Este ano, eu completei, pela graça de Deus, 44 anos no ministério cristão. Comecei novo, né? Muito menininho ainda, mas, ao longo dessa jornada, algumas lições têm sido muito valiosas.
Uma das lições mais valiosas para mim, e continua sendo, é aprender a reconhecer as diferentes etapas na vida ministerial. E isso nos ajuda a conduzir a vida com um discernimento que foge da lógica do nosso entorno, mas que tem trazido muita saúde para o ministério, para a vida pessoal, para a família e para os filhos. Esse tipo de discernimento é importante, mas às vezes não o temos sistematizado em obras. Muito do que vou compartilhar vem do aprendizado ao longo da jornada, em mentorias com irmãos mais experientes e sábios, que fazem perguntas difíceis que nos ajudam a discernir e nos colocam diante de algumas realidades.
O Ponto de Partida: A Conclusão em Eclesiastes
Vamos ler um texto, e vou começar pela conclusão, porque se alguém dormir sábado de manhã, já entendeu o que eu quero dizer, tá bom? Vamos para Eclesiastes, capítulo 3, um texto que vocês conhecem bem. Pode deixar a Bíblia aberta, que nós vamos voltar nesse texto, mas é só para colocar em perspectiva o que nós vamos conversar hoje.
Nos primeiros dois capítulos de Eclesiastes, a perspectiva é de uma história onde Deus não faz parte da equação; uma realidade "debaixo do sol" para a qual não há sentido em nada. No entanto, no capítulo dois, versículo vinte e quatro, Deus entra na história. E quando Deus entra na história, a maneira como olhamos para a vida e para o tempo muda. O autor diz no versículo um que "para tudo há uma ocasião certa, há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu". Mesmo que não entendamos, há um propósito.
Chronos e Kairos: Ressignificando o Tempo
É muito comum ouvirmos e reproduzirmos a expressão: "Estou sem tempo." Essa frase é comum em nossos lábios, enquanto nossa fé declara que há tempo para todo propósito debaixo do céu. Então, o que significa viver numa realidade para a qual tudo tem o seu devido tempo? Como é que a gente encaixa essa declaração "não tenho tempo"? Que desconexão é essa entre a vida que levamos e a que professamos? Professamos uma realidade em que, na história, debaixo do céu, para tudo há um tempo devido, mas é muito comum em nossa fala dizermos: "Não tenho tempo para tal coisa". Estamos sempre apurados por alguma razão.
Na Escritura, temos pelo menos duas palavras para tempo: Chronos, o tempo cronológico, e Kairos, o tempo oportuno de Deus. A pergunta-chave para discernir os tempos e as transições em nossa vida é: "O Chronos que estou vivendo é tempo Kairos para o quê?". Como podemos ressignificar o tempo que estamos vivendo? Precisamos nos perguntar qual é o propósito de Deus para este tempo. Qual é o Kairos de Deus para este Chronos?
A Metáfora do Nado: Águas Diferentes, Estratégias Diferentes
Deixa eu dar uma metáfora pra vocês. Quando menino, aprendi a nadar no rio. A gente nada com a cabeça fora d'água, por causa das pedras e da correnteza. Meu pai me levou a um clube de natação e o treinador pediu que eu atravessasse a piscina. Nadei como quem nada no rio e quase tirei toda a água da piscina. Ele me disse: "Não, você sabe se mover na água, mas você não sabe nadar". E me ensinou a técnica correta, a respirar com a cabeça dentro d'água, de forma completamente diferente.
Aos 11 ou 12 anos, fui à praia sozinho com amigos. Na praia do Rio, devido à correnteza, você entra na água em um ponto e, quando sai, percebe que está em outro. Como eu não conhecia esse fenômeno, entrei na água, nadei para longe e, na hora de voltar, tentei nadar em linha reta, mas a correnteza me jogava para trás. Alguém gritou da areia: "Nada na diagonal!". Como não faltei à aula de geometria, escolhi um lado e, cansadíssimo, consegui sair.
O que quero dizer com isso? Piscina, rio e mar são água, mas temos que aprender a nadar de formas diferentes em águas diferentes. Na nossa vida ministerial, também temos etapas diferentes, e o grande desafio é discernir em que água estamos nadando para saber como conduzir nossa vida em cada momento. Qual é o Kairos de Deus para o Chronos que estou vivendo?
A Maratona da Vida Ministerial: A Sabedoria de Cada Etapa
Eu sempre fui ligado a esportes. Na minha época, o esporte amador oferecia bolsas de estudo em boas escolas, e por isso fiquei conectado a ele até os vinte e poucos anos, e depois voltei a correr maratonas na idade adulta.
O percurso da Maratona do Rio é de 42 quilômetros. O que acontece com um corredor? Ele se cansa. Quanto mais perto do objetivo, mais cansado ele fica. Por isso, uma coisa importante é aprender a dosar a energia.
- O "Muro" e as Fases: No quilômetro 30, enfrentamos o "muro". Até o quilômetro 10, há conversa; depois, silêncio sepulcral para ouvir o corpo. As pernas levam até o quilômetro 30; a cabeça, até o 40; e daí para frente, "só Jesus na causa". No km 25, você se pergunta: "Quem me colocou nisso?". No 27, descobre: "Fui eu". No 30, vê os anjos. E no 35, vem a famosa Coca-Cola para dar uma levantada.
- O Ritmo Certo: O perigo é correr mais rápido do que se treinou no início. Cada minuto acelerado no começo custará dois no final. É preciso dosar a velocidade conforme o treino, sem se comparar com os outros.
- A Sabedoria do Percurso: É preciso aprender a dosar, reconhecer os limites e ser prudente. Muitas vezes, nosso desejo de entrega é tão grande que não reconhecemos nossos limites e nos "queimamos", como uma vela acesa pelos dois lados. Para uma carreira longa, é fundamental dosar a energia e cuidar dos limites.
- A Lição do Km 35: Um treinador que tive ficava escondido entre o km 33 e 35 para avaliar os corredores. Se a pessoa estivesse muito esgotada, ele a aconselhava a parar. Se estivesse bem, ele dizia: "Quilômetro trinta e cinco, não inventa mais nada. Mantém o ritmo, o cuidado, a estratégia, porque você pode estar mais cansado do que imagina". Hoje, com 33 anos de ministério, estou no meu "quilômetro 35", refletindo sobre como correr os últimos seis anos de ministério ativo.
Reconhecendo os Limites e a Humanidade no Ministério
Ao longo da nossa vida ministerial, existem diferentes etapas. Respondemos às mesmas perguntas de formas diferentes em cada uma delas. É preciso sabedoria para um percurso de longo prazo. Não terminamos do mesmo jeito que começamos. O importante é saber que a corrida se faz por etapas, e cada uma exige uma sabedoria específica.
- Necessidades que Mudam: Quando se começa no ministério, com vinte e poucos anos, a realidade é uma. Lembro de começar com um cartão Bradesco, uma Bíblia, uma mochila e uma moringa, rodando o Brasil com dinheiro só de ida. Mas depois vêm os filhos, e com eles, a preocupação. Lembro de uma vez estar nas Ilhas Canárias e receber uma ligação interrompida sobre minha esposa e filho indo para o hospital de ambulância. Foi a pior exposição bíblica que fiz. Aprendi a lição: nunca ligue para casa antes da última exposição.
- Capacitação Contínua: As necessidades de capacitação de um pastor novo são diferentes das de um pastor com 15, 20 ou 30 anos de ministério. Precisamos ser capacitados o tempo inteiro.
- Estilos de Liderança: O estilo de liderança também muda. O pastor novo é caracterizado pelo aprendizado e participação; o sênior, pela intencionalidade e desenvolvimento; e o jubilado, pela graça, sabedoria e frutos.
- Energia e Capacidade: É importante reconhecer nosso nível de energia. Hoje não consigo correr uma maratona com a mesma velocidade de antes. Meu tempo sobe. Antigamente, podia correr três por ano; hoje, meu treinador só deixa uma. Tenho que obedecer. À noite, por exemplo, não dirijo porque durmo fácil, até no farol. Em compensação, levanto muito mais cedo, às 4h ou 4h30 da manhã, o que mudou minha vida de oração.
Conclusão: Terminando a Corrida com Graça
De novo, vamos fechar: tempo é dádiva. Nós não somos donos do nosso tempo; o tempo é um presente dado por Deus. Se o tempo é uma dádiva, a pergunta é: "O Chronos que hoje vivo é Kairos para o quê?". Se Deus nos deu 24 horas para viver, elas são suficientes. Se o tempo que tenho não é suficiente para o que preciso fazer, provavelmente estou fazendo mais do que devo. Tenho que rever isso, simplificando, reduzindo ou renunciando.
Esses limites mostram nossa dimensão de humanidade, e nossa humanidade não é contrária à nossa vocação; a mundanidade é. Nosso exercício ministerial não pode ser uma negação da nossa humanidade. Não podemos pregar um evangelho que promove vida destruindo a nossa. A gente se deixa consumir pelo Reino de Deus, mas isso não é destruição na nossa vida nem na de nossos cônjuges e filhos. Certa vez, conversando com John Stott, ele me disse que eu nunca escreveria livros como ele, não por falta de inteligência, mas porque ele não tinha filhos e eu sim. Ele me aconselhou: "Sua prioridade é escrever esse livro na vida deles. [...] Foco nos seus filhos".
Jesus veio para nos dar vida, e vida em abundância. E essa vida deve se expressar a começar em nós. Ministério integral inclui cuidado da saúde. A coisa mais triste que vejo no ministério é encontrar pastores de longa trajetória presos no ressentimento. Como um ministério que proclama a vida termina ressentido? Onde foi que o ministério deixou de produzir vida em nós?
O evangelho é vida pra todo mundo, inclusive pra quem prega. Não tem coisa mais gostosa do que encontrar aqueles pastores de cabelo branco, com ânimo, disposição, que falam pouco, mas quando falam, pegam onde tinha que pegar. Porque aquele vigor é a verdade do texto bíblico: ainda que o homem exterior se corrompa, o homem interior vai se tornando cada vez mais Metodista Livre.
Sessão de Perguntas e Respostas
- Pergunta 1: Como criar conexões com a juventude nas igrejas tradicionais, considerando a dinâmica atual das comunidades?
- Resposta: A gente não pode confundir antigo com eterno, nem achar que novo é bom. O diálogo é fundamental. A geração mais experiente deve reconhecer sua responsabilidade geracional de transmitir o legado, conforme Salmo 145 e 2 Timóteo 2. E a geração que está atrás deve vir com gratidão pela fidelidade dos que os antecederam. Quando a relação não é de disputa de poder, mas de gratidão e continuidade do projeto de Deus, a transição funciona. As transições, como no triatlo ou no revezamento, são muito importantes e precisam ser cuidadosas. Mais importante que fazer grandes coisas para Deus é perguntar: "O que Deus está fazendo em nós?". A sugestão é: "põe os mais velhos com os mais novos pra orarem juntos" e perguntarem a Deus o que Ele está fazendo em e através deles.
- Pergunta 2: Como discernir o uso do tempo sendo pastor de tempo parcial, com múltiplas funções e TDAH, sentindo que o tempo o consome?
- Resposta: A lógica de Deus para o tempo é diferente da nossa. Se fôssemos nós a decidir, Jesus não viria como criança. Jesus passou 90% do seu tempo se preparando para servir 10% do tempo. Moisés se preparou por 80 anos para liderar por 40. O critério de Deus para as prioridades não é o mesmo do nosso entorno. Por isso, descobrir o Kairos no Chronos é vital. A necessidade não deve definir nosso chamado. Nós não somos chamados a responder a todas as necessidades, mas àquelas para as quais Deus especificamente nos chama. A prioridade advém do discernimento na oração, do tempo de silêncio e do aconselhamento com irmãos mais experientes, que ajudam a focar.
- Pergunta 3: Como lidar com o cansaço e desânimo perto do fim da jornada ministerial, quando a mente ainda quer produzir?
- Resposta: O cansaço e o desânimo podem estar relacionados. Às vezes, o desânimo é resultado de uma sequência de desconsideração do seu limite físico. A gente não descansa adequadamente, se cansa muito, e isso abate nosso emocional. Mais importante que correr é saber descansar. Se não descansamos, todo o desempenho vai pro brejo. É preciso ajustar a expectativa mental à realidade física do corpo. Geralmente, esse desânimo no fim da jornada significa que demos mais do que podíamos ou estamos desconsiderando a necessidade de descansar. Descanse um pouquinho mais, e o ânimo volta.
- Pergunta 4: Como ajudar a nova e a antiga geração a terminarem bem, evitando as "fórmulas" pragmáticas e focando no que Deus está fazendo?
- Resposta: A gente tem uma mente muito pragmática, focada no desempenho. Nosso primeiro chamado não é comparar, mas reconhecer os sinais da graça de Deus no meio do povo. O problema das "fórmulas" de crescimento de igreja é que elas congelam um período e o transformam em uma receita para todos. Elas devem servir como inspiração, um testemunho do que Deus fez em outro lugar, mas não como uma panaceia a ser imposta. O básico é e sempre será "Bíblia, oração e igreja". Devemos chegar a um lugar e perguntar: "Senhor, o que o Senhor está fazendo aqui? Quais são os sinais da tua obra aqui?". E então, cooperamos com o que Deus já está fazendo, encorajando a igreja, sem impor modelos. É preciso aprender o que Deus está fazendo.
Versão Completa
Transcrição da Palestra do Pr. Ziel Machado sobre Etapas da Vida Ministerial
Queridos irmãos e irmãs, graça e paz.
Um pouquinho desse tema que nós vamos conversar: sobre as etapas, as diferentes etapas na vida ministerial.
É uma alegria muito grande fazer parte dessa família, um privilégio.
A minha opção pelo metodismo foi uma opção adulta, né? Na verdade, eu nasci num lar batista, fui educado numa escola franciscana – é porque era a escola da cidade onde meu pai era pastor – e ali é onde estudei. E aí eu fui pra Inglaterra, virei anglicano lá por causa das condições lá. E, quando estava voltando pro Brasil, eu... o Mestre falou assim: “Você não vai voltar anglicano de jeito nenhum. Cê vai, cê vai, vai ficar, tem que voltar de outro jeito.” E então nós estávamos orando sobre isso. E, quando nós chegamos de volta no Brasil, em noventa e dois, a gente recebeu o convite pra ajudar, conhecer os jovens e a Igreja Metodista Livre na Saúde, no bairro da Saúde, aqui pertinho. E aí eu resolvi entrar fundo nessa herança metodista. E eu falei: “Eu fui metodista a vida inteira e não sabia, né?”
Então, é... Mas o meu filho mais velho é pastor batista. Meu pai orou mais do que eu, então eu tenho... mas eu ainda tenho esperança que ele mude.
Então, é uma alegria muito grande estar com vocês aqui. O que eu quero compartilhar com vocês é um pouco das lições da trajetória. Esse ano, eu completei, pela graça de Deus, 44 anos no ministério cristão. Comecei novo, né? Muito menininho ainda, mas, ao longo dessa jornada, algumas lições têm sido muito valiosas. Uma das lições que foram muito valiosas pra mim, e continua sendo, é essa lição de aprender a reconhecer as diferentes etapas na vida ministerial. E isso ajuda muito a gente a conduzir a nossa vida com discernimento, que foge um pouco da lógica do nosso entorno, mas traz muita... tem trazido muita saúde para o ministério, saúde pra minha vida pessoal, saúde pra vida da minha família, saúde pra vida dos meus filhos, saúde para o ministério que a gente vai exercitando. Então, é um tipo de discernimento que é importante, e às vezes a gente não tem esse discernimento sistematizado em obras assim, até porque esse material que eu vou compartilhar com vocês é muito do que eu venho aprendendo ao longo da jornada, nas mentorias pelas quais eu vim passando com irmãos mais experientes, mais sábios, fazendo aquelas perguntas difíceis, que ajudam a gente a discernir, né? Colocando a gente diante de algumas realidades.
Vamos ler então um texto. Eu vou começar pela conclusão, porque se alguém dormir sábado de manhã, já entendeu o que eu quero dizer, tá bom? Então, Eclesiastes capítulo 3, um texto que vocês conhecem bem. Vamos para Eclesiastes capítulo 3 e pode deixar a Bíblia aberta, que nós vamos voltar nesse texto, mas só para colocar em perspectiva o que nós vamos conversar hoje.
Então, no livro de Eclesiastes, nos primeiros dois capítulos, nós temos uma perspectiva da história onde Deus não faz parte da equação, essa realidade debaixo do sol, para o qual não há sentido em nada. No capítulo dois, versículo vinte e quatro, Deus entra na história. E, quando Deus entra na história, a maneira como a gente olha pra história, pra vida, pro tempo, muda. Tá bom? Então, o que o autor diz no versículo um é que para tudo há uma ocasião certa, há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu. Mesmo que a gente não entenda, há um propósito debaixo do céu.
Então, a realidade é que, com muita facilidade, nos nossos lábios, a gente ouve ou a gente reproduz a expressão: “Estou sem tempo.” Essa frase é muito comum nos nossos lábios, enquanto a nossa fé declara que há um tempo para todo propósito debaixo do céu.
Então, o que significa viver numa realidade para a qual tudo tem o seu devido tempo? Como é que a gente encaixa essa declaração “não tenho tempo”, se para todo propósito há um tempo? Que desconexão é essa entre a vida que nós levamos e a vida que nós professamos? Nós professamos uma realidade que, na história, debaixo do céu, para tudo há um tempo devido. Mas, como disse pra vocês, é muito comum na nossa fala, no nosso dia a dia, no nosso estilo de vida: “Não tenho tempo para tal coisa.” Estamos sempre apurados por alguma razão.
E aqui nós temos, então, e aqui é a conclusão que eu gostaria que vocês mantivessem essa atenção o tempo todo, ao longo dessa fala, tá bom? Nós temos duas palavras, pelo menos duas palavras, na Escritura relacionadas a tempo. A gente tem o Chronos, tempo cronológico, e a gente tem o Kairos, lembra? O tempo oportuno de Deus.
Então, a pergunta chave pra gente discernir os tempos e discernir as transições na nossa vida é fazer a seguinte pergunta: O Chronos que eu estou vivendo, dia sete de junho de dois mil e vinte e cinco, é tempo Kairos para o quê? Então, o Chronos que eu estou vivendo é um tempo oportuno para o quê? O tempo cronológico que eu estou vivendo é um tempo oportuno de Deus para o quê? Como é que a gente ressignifica o tempo Chronos que a gente tá vivendo? Então, a gente redime o nosso conceito de tempo, a gente não trabalha num conceito mecânico de tempo cronológico, de tempo... a gente se pergunta: qual é o propósito de Deus para esse tempo que eu estou vivendo? Qual é o Kairos de Deus para esse Chronos que eu tô vivendo?
Então, eu preciso discernir a maneira como eu uso esse tempo. Deixa eu dar uma metáfora pra vocês. Quando eu era menino, meu pai levava a família pra fazer piqueniques numa reserva florestal lá no Rio de Janeiro, lá em Tinguá. E lá tinha um rio. Eu aprendi a nadar no rio, e quando a gente nada no rio, a gente nada com a cabeça fora d'água, porque tem muita pedra, tem muito toco, tem um montão de coisa no rio, tem a correnteza, e a gente soca a água pra poder se mover, não é verdade? Meu pai percebeu que eu gostava de nadar, eu nadava no rio, e ele me levou então pra um clube de natação. E o treinador perguntou: “Ziel, você sabe nadar?” Eu falei: “Sei.” Então ele falou assim: “Atravessa a piscina.” Eu nadei na piscina como quem nada no rio. Eu quase tirei toda a água da piscina, porque eu nadei do mesmo jeito que aprendi a nadar no rio. Mas, na piscina, não tem correnteza, não tem toco de árvore, não tem bicho morto. Ele falou: “Não, você sabe se mover na água, mas você não sabe nadar.” Me deu uma pranchinha, me ensinou a bater perna, a fazer respiração, manter a cabeça dentro d'água, respirar pra um lado, respirar pro outro, e me ensinou a nadar completamente diferente.
Aí, quando eu fiz 11, 12 anos, meu pai me deixou ir à praia sozinho com os meus amigos. Então, eu fui à praia sozinho, e fomos pra praia do Recreio dos Bandeirantes. E, na praia do Rio de Janeiro, devido à correnteza – vocês já têm essa experiência – você tá sentado na areia aqui, você entra na água e fica brincando na água, quando você vai sair da água, percebe que você está aqui, mas onde você estava é lá. Sempre que você percebesse, a correnteza vai te puxando. Bom, eu não conhecia esse fenômeno, então eu entrei na água. E, pra entrar na água, é fácil. Eu nadava muito bem, então eu entrei na água, passei a primeira arrebentação, segunda arrebentação, terceira arrebentação, quarta arrebentação, tô lá com os surfistas, lá longe. Cansei, hora de voltar. E eu tentei voltar pra praia, nadando do mesmo jeito que eu entrei: em linha reta. E qual foi a surpresa? Para cada duas braçadas que eu dava pra frente, o meu corpo dava quatro braçadas pra trás. Então, ao invés de ir em direção à praia, a correnteza tá me jogando mais pra dentro do mar. Alguém então gritou da areia: “Nada na diagonal!” Como eu não faltei aula de geometria, eu sabia que na diagonal é 45 graus. Eu escolhi um lado, e eu consegui, cansadíssimo. E aí depois eu aprendi: por causa da correnteza, a gente tem que nadar em diagonal.
O que eu quero dizer com isso? Piscina é água, rio é água, o mar é água, mas a gente tem que aprender a nadar de forma diferente. A gente não nada da mesma forma em águas diferentes. Na nossa vida ministerial também, nós temos etapas diferentes, e o grande desafio pra gente é discernir que água é essa que eu tô nadando nesse momento da minha vida, que água é essa que eu tô nadando, qual é a forma que eu tenho que conduzir a minha vida nesse momento, nesse momento cronológico que eu estou vivendo: cinco anos de ministério, dez anos de ministério, vinte e cinco anos de ministério, trinta anos de ministério. Nesse momento que eu estou vivendo o ministério, qual é o Kairos de Deus pra esse Chronos? Como é que eu percebo, para além da quantidade de dias e anos, o sentido e o chamado de Deus pra esse momento da minha vida?
Então, esse é o desafio, tá bom? Vamos tentar construir essa conclusão até o final do processo. Vamos passar aqui o primeiro slide aqui, e vocês vão ver se dá certo. Aqui o primeiro slide vai... Ah, tá bom, ótimo.
Eu sempre fui ligado a esportes, foi a forma como meu pai encontrou, como um pastor duro, pra que eu pudesse estudar em boas escolas. Foi me colocar no esporte, porque na minha época, no Rio de Janeiro, o esporte amador oferecia pra gente a alternativa de bolsas de estudos em boas escolas. A gente não podia receber salário, mas podia receber bolsa de estudo. Então, eu sempre fiquei conectado com o esporte, desde os oito anos de idade até os vinte, vinte e quatro, vinte e três anos, conectado com o esporte. Depois passei um tempo longe, e aí, na idade adulta, voltei pra prática de esporte, eu voltei a correr maratonas.
Esse é o percurso da maratona do Rio, antigo percurso, porque já mudou agora. Até dois mil e dezoito foi esse percurso. A gente sai aqui da praia do Recreio, vai até a praia da Macumba – a gente não fica lá, Jesus liberta a gente – e a gente volta correndo: Recreio, Barra, São Conrado. No Vidigal, a gente acelera um pouquinho. Aí o Leblon é quilômetro trinta, a gente desce o Leblon, Ipanema forte, Copacabana. E Copacabana é aquela barriga enorme, a gente vê o Copacabana Palace, parece que tá pertinho, mas faz um “U”, né? Então, demora muito pra chegar lá, Leme. Aí passa do túnel, chega ali no Botafogo, ah, e termina ali perto da Marquesa de Abrantes, no Flamengo. São quarenta e dois quilômetros. Então, é muito fácil ver aqui, né? Mas fazer esse percurso é outra história, né?
Agora vamos lá, vamos conversar um pouco sobre isso. O que é que vocês imaginam que acontece com o corredor ao longo dessa prova? Que tipo de coisa acontece com uma pessoa que faz uma banda à toa, numa coisa de longo prazo, de longo percurso? Que tipo de coisa? Vamos lá: cê se cansa, cê começa descansado, e você vai se cansando. Quanto mais perto do objetivo, mais cansado você se torna, certo? Então, uma coisa importante ao longo da jornada é aprender a dosar a energia, porque cê quer terminar. A gente tem o chamado fenômeno do muro, no quilômetro trinta, que é mais ou menos assim: até o quilômetro dez a gente vai conversando, vai encontrando os colegas de outras provas; do dez em diante, aquele silêncio sepulcral. Se você ver alguém falando, cê diz: “Não vai correr, tudo vai parar no quinze.” Mas é silêncio, porque agora você não quer mais conversar com as pessoas, você quer ouvir o seu corpo. As pernas vão te levar até o trinta; do trinta em diante até o quarenta, é a cabeça que te leva; e do quarenta até o final, é só Jesus na causa.
Mas aí, quando chega no quilômetro vinte e cinco, a gente começa a se perguntar, em silêncio: “Quem foi o maluco que me colocou nesse negócio?” Aí, no quilômetro vinte e sete, você descobre: fui eu, fui eu que paguei o ingresso pra essa joça, eu sou é doido, tá entendendo? No quilômetro trinta, você vê os anjos descendo do céu na escada de Jacó, cantando o hino: “Vem, alma cansada, tomada de dor”, entendeu? No trinta e cinco, vem a famosa Coca-Cola santa de Israel, e essa Coca-colazinha dá uma levantada na gente pra gente terminar.
O que eu quero dizer é o seguinte: a prova começa aqui no Brasil por volta de cinco e meia, seis horas da manhã, muito cedo. No Chile, por exemplo, começou nove horas da manhã, é outra coisa, outro desafio, né? O que acontece? Você treinou quatro, seis meses pra fazer uma prova de longa distância, então você tá preparado. Muito cedo, o clima é favorável. Qual o perigo? A gente correr mais rápido do que a gente treinou. Então, pra cada minuto que você acelera no início, vai faltar dois no final. É igual você encher o tanque do carro e rodar muito rápido, acelerar demais, você queima a quantidade de combustível. Então, se você treinou pra correr o quilômetro a seis minutos, a seis minutos o quilômetro, mesmo que você se sinta bem e possa fazer mais rápido, você, por saber que vai ter que fazer quarenta e dois, dosa a sua velocidade pra fazer conforme você treinou.
Então, uma das coisas importantes pra poder terminar um percurso de longa duração é dosar a energia, reconhecer o seu limite, ser prudente. Não vá muito rápido, não se comparar com quem tá indo mais rápido do que você. Eu tenho um amigo meu que, judeu, corre comigo. Eu chego, eu digo que ele é o Antigo Testamento, eu sou o Novo Testamento. Eu digo pra ele: ele é muito competitivo. A gente se preparou pra última prova que a gente fez no Rio, foi uma prova bonita, só que, quando ele chega na hora, ele quer sair na frente. Eu geralmente saio em frente da ambulância, eu vou lá pra trás, colo na ambulância, porque aí ninguém me passa, eu sou o último, eu só vou passando as pessoas, vai aumentando a minha estima, tá entendendo? Mas ele quis ir na frente. Quando chegou no quilômetro quarenta, no túnel, eu vi que ele tava com câimbra, parado na parede. Eu falei: “Ô, fulano, cê tá aí quebrado, é?” “Pois é, cara, deu câimbra, eu vim muito rápido.” Falei: “Velho Testamento é fogo, vem com o Novo, vem comigo.” Ele disse: “Ah, tô quebrado.” Falei: “Não, vamos junto, mas vai terminar o seu tempo, rapaz. O importante aqui é terminar, vamos junto.” E aí, juntos, a gente conseguiu: corria um pouquinho, caminhava um pouquinho, corria um pouquinho, caminhava um pouquinho, e conseguimos terminar. Uma das fotos mais bonitas que eu tenho de final de maratona é com ele terminando essa prova. Mas é aprender a dosar.
Muitas vezes, ao longo do nosso ministério, o nosso desejo de entrega, o nosso empenho, o nosso esforço é tão grande que a gente não reconhece os nossos limites, e a gente vai com uma entrega tão intensa que a gente se queima. É como acender a vela pelos dois lados, a gente queima o pavio muito rápido. Então, uma das coisas importantes pra uma carreira ministerial longa é saber dosar a nossa energia e cuidar dos nossos limites, saber com que água a gente tá nadando, em que etapa a gente tá fazendo, qual é o sentido, o Kairos desse Chronos que eu tô vivendo.
Então, o cansaço é uma coisa. Então, o cansaço faz com que, a cada percurso, a gente corra de maneira diferente. Muda a pisada: cê tá cansado, cê faz pisada mais curtinha, não abre tanto a perna pra não focar tanto no aéreo, cê muda a técnica de corrida quando vai subir, por exemplo. Vocês acham que é mais fácil na corrida: subir, descer ou correr no plano? O que é o mais difícil na corrida: subida ou descida, né? Não, é o plano, gente. Sabe por quê? É o plano, porque cê fica socando a mesma musculatura o tempo todo. Então, às vezes, quando cê tá, por exemplo, no Rio aqui, quando chega lá no Vidigal, é uma subida no quilômetro 28, é um alívio, porque cê vai mobilizar outra musculatura da perna. Então, cê tá socando do mesmo jeito no plano: pá, pá, pá, pá. Vem uma subidinha: “Ah, que descanso!” Na descidinha, você larga e vai de beleza, tá entendendo? Aí, de novo, plano: “Ah, de plano de novo!” Então, geralmente, o mais difícil não é onde a gente imagina, é onde a gente menos imagina.
Outra coisa que é importante: eu já corri essa prova sete vezes, já fiz com chuva, com sol, com frio, com calor. Quando muda a temperatura, cada cinco graus que muda, a interferência no nosso organismo é absurda, quinze por cento, mais ou menos. Então, por exemplo, Madrid começou com dois graus, a prova terminou com trinta e dois. Então, a gente tem que ir monitorando a cada percurso: os primeiros cinco quilômetros se correm de um jeito, os outros cinco se correm de um jeito, os outros cinco se correm de um jeito. Então, por exemplo, eu nunca entro numa maratona pensando no quarenta e dois. Eu penso nos próximos cinco: como é que eu vou correr os próximos cinco? Depois, mais cinco, depois, mais cinco, depois, mais cinco. Há sabedoria pra cada percurso na vida. Então, assim como o percurso é igual pra todo mundo, o desempenho não é igual. Cada etapa tem o seu desafio. Se você não aprende a ler as etapas e discernir como cê deve correr cada etapa, você não conclui a prova.
Eu tive um treinador muito amigo, amanhã tá com uma equipe correndo na África do Sul, 92 km com raids amanhã. Ele ficava escondido entre o quilômetro trinta e três e o trinta e cinco, cê nunca sabia onde ele tava, porque ele ficava escondido. Ele queria ver como é que a gente chegava no quilômetro trinta e três. Se a gente chegava todo largado, ele vinha por trás da gente, dava um toque no ombro e dizia: “Vamos treinar pra próxima, você tá muito esgotado, essa prova não é pra você, cê vai se machucar se continuar assim. Vamos sair, já deu, é isso mesmo.” Se nós não víssemos entre o trinta e três e o trinta e cinco, significava que no trinta e seis ele aparecia na nossa frente com um celular pra tirar uma foto. Era o nosso último sorriso antes da morte. E ele dizia assim: “Quilômetro trinta e cinco, não inventa mais nada. Você chegou até aqui, agora, daqui até o final, mantém o mesmo ritmo, o mesmo cuidado, a mesma estratégia. Vai tranquilo que cê vai chegar no final, só faltam sete quilômetros, vai tranquilo, não inventa nada no trinta e cinco, porque cê pode tá muito cansado, mais cansado do que você possa imaginar, e se você fizer alguma coisa diferente, você pode não terminar a prova.”
Então, a sabedoria do trinta e cinco... Hoje, por exemplo, eu tô no ministério na Igreja Metodista Livre, é meu trigésimo terceiro ano como pastor na Igreja Metodista Livre. Daqui um pouquinho mais, vai chegar o tempo do jubilamento, né, isso da jubilação. Então, eu tô no meu quilômetro trinta e cinco agora. Então, nesse momento, eu tô me perguntando: nos seis anos que me faltam – eu tô com 64 –, nos seis anos que me faltam, como é que eu faço essa jornada? Ao que eu me dedico? Como eu uso melhor os meus dons? Como uso melhor o meu tempo? Pra que Deus tá me chamando nesses últimos seis anos de ministério ativo? Como é que eu utilizo bem aquilo que eu vim aprendendo ao longo da jornada nesses seis anos finais? Então, é a síndrome do quilômetro trinta e cinco aqui.
Então, como o apóstolo Paulo, eu também aplico muito essas lições da corrida pra vida ministerial. O que eu queria que vocês percebessem aqui é que, ao longo da nossa vida ministerial, existem diferentes etapas, tá bom? E, assim, a gente responde as mesmas perguntas, nas diferentes etapas, de forma diferente. Então, é preciso sabedoria pra fazer um percurso de longo prazo. A gente não termina do mesmo jeito que a gente começou, nós não somos a mesma pessoa quando começamos, nós temos limitações físicas ou limitações de outra ordem, ou possibilidades que nós não tínhamos no início, ou desafios novos. O importante é a gente saber que uma corrida de longa distância se faz por etapas, e cada etapa exige uma sabedoria importante. E a sabedoria nasce da resposta a essa pergunta que eu falei pra vocês: como é que a gente descobre o sentido oportuno, o Kairos, no meio do Chronos que nós estamos vivendo?
Então, o importante é a gente reconhecer esse tipo de coisa, porque, às vezes, a gente acha que não, que tem que começar de um jeito e terminar do mesmo jeito. Mas a realidade não é assim, né, gente? Quando você começa no ministério, está lá com vinte e poucos anos, dormindo numa esteira, andando com uma moringa com água, uma mochila, um cartão Bradesco e uma Bíblia com pomba na capa, toda marcada, e vai rodando o Brasil todo, né? Eu me lembro, quando comecei com vinte anos, tinha um cartão Bradesco, uma Bíblia, uma mochila e uma moringa. Disseram pra mim: “Você tem que visitar o Brasil todo.” Então, eu ia com dinheiro de ida, sem saber se tinha dinheiro de volta. Uma vez, fui visitar o grupo da ABU de Goiânia. Só tinha dinheiro de ida. Cheguei na rodoviária às sete da manhã, esqueceram de me buscar. Eu não sabia se vinha alguém, não tinha celular naquela época, não tinha dinheiro pra voltar, nem pra comer, nada. Sentei no chão da rodoviária e falei: “Senhor, tô aqui nas tuas mãos.” Às nove da noite, quando ia começar o evento, o pessoal falou: “O Ziel não chegou.” “Ué, ele chegou na rodoviária hoje.” Aí foram ver na carta, dizia que eu ia chegar às seis da manhã. Foram lá na rodoviária me buscar, eu lá, numa moto, indo pro acampamento, de mochila, com os livros da editora na mão, sentado atrás de uma moto, pulando pra chegar, né?
Me lembrou quando papai fazia trabalho de evangelização lá no interior do Rio de Janeiro. Eu me lembro como se fosse hoje: fomos de carro até a beira do Rio Guandu. No Rio Guandu, tivemos que pegar uma canoa com um senhor que fazia com aqueles... aqueles pontes, assim, não sei como é que fala, ponte, né? Uma madeira alta que empurra pra atravessar a canoa. Atravessamos a canoa. Do outro lado, tinha um senhor nos esperando numa prancha. Prancha, no Rio de Janeiro, não é prancha de surfe, é uma carroça sem a lateral, só a tábua, sem proteção. O carroceiro ia em pé no meio da carroça, tocando o cavalo. Minha mãe sentou numa ponta da frente, meu pai na outra, eu numa outra ponta, minha irmã em outra. O carroceiro vai que vai, e eu falei: “Pai, pai, pai...” “Que foi, menino?” “Minha irmã caiu lá atrás, tá lá no meio do mato, cheio de carrapicho no pescoço, pequenininha, devia ter uns quatro, cinco anos.” É desse jeito que a gente fazia as coisas, né? Depois, as coisas melhoraram. Papai comprou um fusquinha sessenta e seis, aí a gente... papai era pastor em São Lourenço, Minas Gerais, e combinava com os amigos da igreja e saía aquele grupo de fusquinha, cinco horas da manhã, de Nova Iguaçu pra ir pra São Lourenço. As coisas foram mudando, né?
Ou seja, a gente entra com uma realidade, mas depois tem filhos, vem a preocupação. E você sabe, quando tem filhos e viaja, acontece tudo com os filhos, não é verdade? Eu estava trabalhando nas Ilhas Canárias, lá do outro lado do mundo. As Ilhas Canárias pertencem à Espanha, mas ficam no continente africano. Fiquei quinze dias trabalhando lá, fazendo exposição, e resolvi, no último dia antes da exposição, fazer uma chamada telefônica pra casa. Liguei pra casa a cobrar, e foi minha filha, que tinha cinco anos, quem atendeu. Falei: “Sara, tudo bem, papai?” “Tudo bem, pai. Foi mó legal ontem.” “O que foi?” “A ambulância fazendo barulho, levando a mamãe e o Lucas.” E a ligação caiu, pum! “Ô, meu Deus do céu...” Falei, tenho que fazer minha última exposição bíblica agora, mas estou com a imagem da ambulância levando o Lucas e a Solange pro hospital, e não sei o que aconteceu porque a ligação caiu. Foi a pior última exposição bíblica que já fiz na vida. Aprendi a lição: nunca ligue pra casa antes da última exposição. Faça a exposição, depois ligue pra casa. Consegui ligar depois, minha cunhada atendeu: “Ziel, quando peguei o telefone, caiu. Só queria dizer que está tudo bem.” Essas loucuras, né?
Então, as necessidades mudam, né, gente? Quais são as necessidades de capacitação que um pastor novo tem? Quais são as necessidades de capacitação que um pastor com quinze, vinte anos de ministério tem? Com trinta anos de ministério? A gente necessita ser capacitado o tempo inteiro. Esse quadro é só pra inspirar vocês, pra saberem que precisamos reconhecer em qual etapa da corrida estamos, quais são as necessidades que temos. Seria um lindo exercício juntar os pastores e fazer um brainstorm, tentar preencher: vamos dividir nosso ministério em anos, o que é um pastor novo, o que é um pastor sênior, o que é um pastor experiente, executivo, enfim, bota a categoria que quiser, divide em anos e diz quais são as necessidades que cada um de nós, olhando pra trás, reconhecemos que teria sido bom trabalhar naquela etapa.
Então, as necessidades de desenvolvimento pessoal: como ajudar a gestar a vocação dessa pessoa? Tá bom? Deixa eu ver qual é o próximo slide que temos, a próxima cidade... Ah, tá, é a conclusão então.
O estilo de liderança, por exemplo: o pastor novo é caracterizado pelo aprendizado, amizade e participação; o sênior, pela intencionalidade, desenvolvimento; o jubilado, pela graça, sabedoria e frutos. Como posso usar agora melhor os meus recursos, uma vez que não tenho tanta energia como tinha aos vinte anos? O esporte me ajuda, porque não consigo correr a maratona hoje com a mesma velocidade que corria aos vinte anos. É óbvio, meu tempo sobe, dependendo da condição física sobe. Teve época que eu podia correr três maratonas no ano, hoje meu treinador só me deixa correr uma por ano, porque preciso de uns quatro meses pra me preparar e uns sete meses pra me recuperar, tá entendendo? E a última que fiz foi em 2019, ainda não recebi permissão pra voltar a fazer maratona, tenho que obedecer, tem que obedecer.
Então, é importante reconhecer nosso nível de energia, nossa capacidade. Hoje, por exemplo, à noite, não dirijo porque durmo facinho, até no farol, no trânsito, qualquer lugar. Farol demorou mais um pouquinho, já estou dormindo, é facinho pra dormir. Mas também levanto muito mais cedo, então mudou a vida de oração, obviamente. Agora levanto quatro da manhã, quatro e meia da manhã. É claro que, quando dá dez da noite, viro couve. O pessoal da igreja já sabe: não me convide pra reunião às dez da noite, porque viro couve, mesmo, fico com cara de couve, entendeu? Tô só no automático, ouvindo, não tô entendendo nada, porque apago mesmo por causa do cansaço.
Qual é o próximo slide que temos? Deixa eu ver, estamos terminando, gente. Tem mais slide ou acabou? Acabou, né? Acabou? Ah, acabou. Então, é isso.
Então, gente, de novo, vamos voltar pra fechar: tempo é dádiva. Nós não somos donos do nosso tempo, o tempo é um presente dado por Deus. Se o tempo é uma dádiva dada por Deus, a pergunta pra gente é: o Cronos que hoje vivo é Cairo para o quê? O tempo cronológico que hoje vivo é tempo oportuno de Deus para o quê? Para o que Deus está me chamando nesse tempo, nessa etapa da minha vida que estou vivendo? Então, a gente faz esse discernimento: se Deus nos deu vinte e quatro horas pra viver, vinte e quatro horas é suficiente a cada dia. Se o tempo que tenho não é suficiente pras coisas que tenho que fazer, provavelmente estou fazendo mais do que devo. Tenho que rever isso, simplificando, reduzindo ou renunciando.
Outra coisa importante é que esses limites que vamos experimentando ao longo da vida mostram nossa dimensão de humanidade, mas nossa humanidade não é contrária à nossa vocação; o que é contrário à nossa vocação é a nossa mundanidade. Então, nosso exercício ministerial não pode ser uma negação da nossa humanidade. Não podemos pregar um evangelho que promove vida destruindo a nossa, tá entendendo? A gente se deixa consumir pelo Reino de Deus, mas não é destruição na nossa vida, certo? Não somente da nossa vida, mas da vida dos nossos cônjuges e dos nossos filhos.
Certa vez, conversando com o Stott, falei pra ele assim: “Stott, como faço para escrever livros como você?” Ele disse: “Você nunca vai escrever livros como eu.” Eu: “Putz, que forma elegante de me chamar de burro, né?” Ele percebeu minha decepção e disse: “Não, Ziel, não tem a ver com sua inteligência, tem a ver com o fato de que eu não tenho filhos e você tem filhos. Sua prioridade é escrever esse livro na vida deles. Vai chegar o momento em que você vai poder escrever alguma coisa, mas agora, foco nos seus filhos.” Eu falei: “Ah, entendi, entendi, entendi.”
Então, cuidado pra, no exercício do ministério, a gente negar com os atos o que afirma ser o evangelho. Jesus veio para nos dar vida, não religião, vida, e vida em abundância. E essa vida deve se expressar a começar em mim, como a gente canta. Então, ministério integral inclui arroz integral, purê integral, cuidado da saúde, né? Cuidado da saúde é importante, né, gente?
Ótimo, então a gente reconhece limite, por reconhecer limite a gente sabe que somos chamados pra servir ao Senhor nesse ministério de uma longa jornada. É uma maratona a nossa vida ministerial, e precisamos reconhecer em que etapa estamos, que água é essa que estamos nadando, o que precisamos e devemos priorizar nesse momento, dentro do tempo que Deus nos deu como dádiva. E assim, vamos ser edificados pelo testemunho das pessoas e também edificar pelo nosso testemunho, porque vamos fazer uma trajetória com sabedoria, preservando a vida.
A coisa mais triste que vejo no ministério cristão é quando encontro amigos, pastores já de longa trajetória, que, por alguma razão, estão presos no ressentimento. Como é que um ministério que proclama a vida termina ressentido? Onde foi que esse ressentimento entrou? Onde foi que o ministério deixou de produzir vida na vida da gente? Onde foi que a gente comeu essa bola?
Acabamos de terminar agora o projeto Grão de Mostarda, o PGM, alguns de vocês conhecem, né? Um projeto de mentoria espiritual, os quatro mentores: Ricardo, Valdir, eu e Osmar Ludovico. Terminamos esse modelo porque acreditamos que agora queríamos fazer um ministério baseado na oração e na amizade, que tivesse continuidade, mas nunca tivemos CNPJ, nem conta bancária, nunca recebemos dinheiro nenhum. Só tínhamos a oração, a data e o desejo de se encontrar e trazer as pessoas pra ficar com a gente. Foi possível construir um ministério assim, de trinta e um anos. E a coisa mais legal desse processo foi que, depois de trinta e um anos, não terminamos secos, nem ressentidos; terminamos melhor do que começamos, animados, confiando mais na graça.
Quando desconsideramos essa trajetória longa, os limites, nossa humanidade e o presente da vida que Deus nos dá com o tempo, muitas vezes damos guarida a ressentimentos no coração que vão devorando a gente por dentro, e é muito ruim alguém que dedicou toda a vida a pregar o ministério da graça e da vida terminar cínico e ressentido. Então, é quase um contra-testemunho. O evangelho é vida pra todo mundo, inclusive pra quem prega, pra gente também.
Não tem coisa mais gostosa do que encontrar aqueles pastores do cabelo branco, velhinho, mal conseguem segurar a Bíblia, mas com ânimo, disposição, falam pouco, mas o que falam, você diz: pegou onde tinha que pegar, não é verdade? Porque aquele vigor é a verdade do texto bíblico: ainda que o homem exterior se corrompa, o homem interior vai se tornando, no grego profundo, cada vez mais Metodista Livre, né? Isso tá acontecendo, cada vez mais transformado, no grego profundo. Tá pronta essa lá, Metodista Livre, brincadeira! Tá gravando esse negócio, que bobagem, que bobagem.
Tá bom, acho que é isso aí. A gente pode fazer um diálogo agora com perguntas e tal, fiquem à vontade. Se eu não souber, o Bispo tá aqui, responde tudo, tá bom? Jóia, é isso.
Sessão Perguntas e Respostas:
— Tem pergunta?
— Opa! Quer fazer no microfone pro pessoal poder ouvir?
— A minha pergunta é a seguinte: a gente trabalha com jovens na nossa igreja, e a gente sabe que a dinâmica da juventude hoje está relacionada diretamente à comunidade. E a gente vê que, talvez, conversando com meus amigos ali — ó, aquela dupla maravilhosa — a gente enxerga que as igrejas tradicionais têm tido mais dificuldade de criar conexões com a juventude por causa desse movimento que a gente vê. Na sua visão, qual seria uma estratégia ideal, tendo em vista tudo isso que você falou sobre a questão de remir o tempo e tudo, de ter sabedoria pra lidar com o tempo, as etapas... Como você enxerga, já com a sua maturidade, com a sua experiência, como que nós, como igreja, nós, como líderes de jovens cuidando dessa parte, podemos virar o jogo ou começar a virar o jogo? Porque tem coisa que é paulatina, né, tem um tempo pra ser realizada... Mas eu queria ouvir de você: o que você acha? Obrigado.
— Acho que duas coisas, né? A gente não pode confundir antigo com eterno, nem achar que porque é novo é bom, né? Então, essa é a última profecia de Malaquias: ele vai converter o coração dos pais aos filhos e dos filhos aos pais, é isso. O diálogo é fundamental. Então, eu diria: a geração mais idosa, ou mais experiente, deve reconhecer a sua responsabilidade geracional. Salmo 145: cada geração de geração vai proclamar que o Senhor é bom. Segunda Timóteo 2: o que você recebeu de mim, transmita a outros fiéis e idôneos. Então, a geração que está adiante sabe da sua responsabilidade de transmitir à nova geração e criar espaço para que essa nova geração amadureça.
Então, essa transição a gente faz assim: eu faço e você vê; você faz comigo, eu vejo você fazendo; você faz, eu vejo você fazendo; e você faz sozinho agora, entendeu? Sabe, igual com o remo: você tem que botar o remo e fazer a transição completa. Então, o diálogo é importante. A geração que está na frente tem essa responsabilidade diante de Deus de transmitir o que recebeu para a próxima geração. E a geração que está atrás tem que vir com o coração agradecido pela fidelidade daqueles que estão se permanecendo fiéis, que vão transmitir.
Então, quando a geração que vem, vem com gratidão, e a geração que está adiante transmite com essa responsabilidade de gratidão, a coisa funciona. O diálogo funciona bem. Às vezes, quando é no tom de disputa de poder, aí é complicado, porque o poder contamina as coisas, né? Mas quando tudo é visto como uma transição geracional, é tão importante... Por exemplo, no triatlo, usando a imagem do esporte: a gente sai da água pra bicicleta, da bicicleta pra corrida, certo? O que é mais importante no triatlo, sabe o que é? As transições. Você tem que treinar essas transições muito bem treinadas. Na corrida de revezamento, por exemplo, quando você passa o bastão pra próxima geração na velocidade, você tem que treinar muito aquela transição, porque você pode perder toda a prova treinando um ano se fizer a transição equivocada. Então, as transições são muito cuidadosas, muito cuidadosas.
Às vezes, quando a gente está preocupado em fazer grandes coisas pra Deus, a gente está mais numa preocupação meio narcisista. Mais importante do que fazer grandes coisas pra Deus é perguntar: o que é que Deus está fazendo em nós? E como é que aquilo que está fazendo em mim se reflete naquilo que eu vou fazer, entendeu? Então, eu acho que: põe os mais velhos com os mais novos pra orarem juntos, e cada um começa a orar com essa oração: "Senhor, o que é que o Senhor está fazendo em nós nesse momento? E o que o Senhor quer fazer através de nós nesse momento?" E aí a gente cria um ambiente de respeito, de gratidão e consideração, e de conversa franca e honesta, que não se trata de superação, nem se trata de tomar o poder, se trata de continuar nesse projeto histórico de Deus de redenção na história, onde uma geração agora se alegra de poder ver a nova geração que chega, e a nova geração chega com humildade, reconhecendo a fidelidade dos irmãos que antecederam, e agora diz que Deus nos capacite a conduzir essa tocha da mesma forma, fiel como vocês conduziram pra nova geração.
Mas quando é questão de disputa de espaço, de poder, de projeção, aí já contaminou, né? A Bíblia é muito clara: entre vocês não deve ser assim, né? Então, eu diria: chama pra orar, chama pra orar junto e começa a perguntar: "Senhor, o que é que o Senhor está fazendo na nossa vida nesse momento? O que esse momento significa aqui?" E então o próprio Senhor vai abrindo os nossos olhos, criando um ambiente seguro, e a gente vai modelando pras novas gerações essa transição de maneira saudável.
Uma coisa importante é o seguinte: Deus nunca nos chama pra situações ideais; Deus nos chama pra situações reais. É chumbo, né? Se você é fiel a Deus num pouco problema, saiba que sobre muito problema Ele vai te colocar, e isso é bênção. Tá bom? Igreja boa é igreja que cresce em problema, certo, gente? Porque o evangelho vai invadindo as trevas, não é isso? E quanto mais o evangelho invade, é mais treva que a gente encontra, é ou não é? A gente vai se surpreendendo com a capacidade que o pecado tem de esculhambar a vida dos outros, é ou não é? Mas isso é graça de Deus. Então, o problema que você tem na igreja hoje é maior do que você tinha ontem, mas é menor do que você vai ter amanhã. Mas a graça de Deus foi suficiente ontem, é suficiente hoje, vai ser suficiente amanhã. Então, igreja boa é isso: cresce em problema, é isso mesmo, é desse jeito, tá entendendo? Cês não sabiam disso? Ah, agora cê entendeu, né? Agora a palavra chegou, né? Animador, né?
Eu digo que a teologia pastoral é igual pato: por cima d'água, tranquilo assim, ó, por baixo, aquele desespero, né? Chegou uma senhora na igreja com uma criança assim: "Pastor, ora pelo meu filho, ele tem oito anos, não aprendeu a ler e escrever ainda." Eu falei: "Que isso? Japonesinho com oito anos faz derivada integral, que que tá acontecendo aqui?" Falei: "Tem algum problema, né?" Aí chamei lá as psicopedagogas da igreja pra ver o que tava acontecendo, e descobrimos que havia um problema seríssimo na família, e a criança, como forma de reação, ia mal na escola pra fazer o pai sofrer. Então, a gente lidou com essa situação, e a coisa era mais grave do que imaginava, muito mais grave. Aí hoje, quando chega alguém na igreja e pergunta pra mim assim: "Pastor, pode orar pelo meu filho?" Eu falei: "Quantos tios ele tem?" Porque quem apanha sabe, né?
Então, nessas transições, é muito importante a geração anterior saber da sua responsabilidade de passar pras novas gerações. Faz parte isso. E a geração que chega, chegar com gratidão, porque a ideia não é superar, a ideia é ser fiel. A ideia é receber essa tocha, receber essa responsabilidade com fidelidade e pedir a Deus que nos ajude a ser fiéis a tal ponto que chega o momento em que nós vamos ter que passar pra outros. Então, não é disputa, é sentido de reverência e responsabilidade. Mas quando fica no tom da disputa, aí a coisa desanda, né? A gente copia o modelo do mundo, aí não dá certo. Mas se a gente faz isso na presença de Deus, com gratidão por aqueles que foram fiéis e por aqueles que estão chegando, a gente consegue um clima melhor pra lidar com essa transição geracional, não é? Tá bom?
— Sim. Ó, o pessoal que tá em casa poder ouvir... tu acha que eu vou pagar mico sozinho? Não, vem aqui.
— Eu tive aula com você em 2006 e, na verdade, eu queria te fazer uma pergunta: como é que você conseguiu, dentro de toda a sua jornada, discernir esse tempo? Porque sou pastor de tempo parcial, trabalho pra três empresas, e hoje mexeu muito comigo sobre esse negócio do tempo, e, uns dois meses atrás, é que eu consigo agora tirar um dia pra eu parar, porque eu sou o H do TDAH, a minha mente é muito acelerada, sou pastor na periferia, amo o que faço, trabalho pra três empresas, tenho muita cobrança, mas quando que você conseguiu discernir? Porque isso mexeu muito comigo: eu não tenho posse do tempo, é uma dádiva, mas eu tenho começado a buscar a Deus mais nas madrugadas, e o tempo, às vezes, ele acaba te consumindo. Então, eu queria te perguntar isso, porque às vezes a gente cai nessa de querer fazer... E, graças a Deus, a nossa igreja lá de Heinberg, a gente acabou com o ativismo, e eu sei que o tempo é tudo que eu tenho na minha vida que não é meu. Então, eu queria te fazer essa pergunta.
— Que pergunta boa! A lógica que Deus utiliza pro tempo é muito interessante, né? Se nós fôssemos decidir quando Jesus vinha e quando ele fosse embora, Jesus jamais viria criança, certo? Pra quê? Perdendo tempo tomando fuxicóia ou sujando fralda? Já chega com trinta anos, logo detonando, é ou não é? Mas Deus, em Cristo, veio bebê. Naquela criança: "Eu vi a tua salvação, despede o teu servo em paz", é ou não é? Então, presta só atenção comigo: Jesus passou noventa por cento do seu tempo se preparando pra servir dez por cento do tempo. E, quando chegou na cruz, disse: "Está consumado", não disse: "Estou consumido", certo? Ou seja, na lógica de Deus, Moisés ficou quarenta anos no Egito aprendendo, quarenta anos no deserto desaprendendo, pra levar o povo por mais quarenta anos, certo? Oitenta anos se preparando pra quarenta anos. Jesus, trinta anos se preparando pra três anos. Então, o critério que Deus utiliza pra estabelecer as prioridades não são os mesmos critérios que o nosso entorno utiliza. Por isso que eu acho que descobrir o Kairós no Chronos é vital, porque a gente vai descobrir a prioridade, não lançada do meu narcisismo, não lançada do meu ativismo. Eu não sou chamado a fazer todas as coisas.
Por exemplo, não é a necessidade que define meu chamado, gente. Necessidade é igual lavar louça: você lava a louça assim, ó, quando você vira pra cá tem outra pilha aqui, aí você lava aqui, aparece outra pilha aqui, o trem não acaba nunca. Se o meu salário fosse igual lavar louça, eu tava rico, é ou não é? Porque tem louça o tempo todo. De onde sai tanta louça? Eu nem sabia que minha casa tinha tanta louça assim, é ou não é? Então, a necessidade não define o nosso chamado. Meu pai sempre dizia: "Meu filho, amanhã, se eu morrer, na porta daqui de casa não vai ter ninguém querendo casar com a sua mãe, nem querendo ser seu pai." A minha mãe: "Como é que é?" "É, não vai ter mesmo não." Mas na porta da igreja vai ter um montão de gente com currículo. O que ele quer dizer? Eu não posso transferir a minha responsabilidade paterna, eu sou seu pai, eu tenho que cuidar de você, disso aqui. Ou seja, as necessidades sempre vão haver, mas nós não somos chamados a responder às necessidades no geral; Deus nos chama a, no meio daquelas necessidades, se ocupar dessa, se ocupar dessa.
Jesus não veio à América Latina pra evangelizar, ele limitou o seu ministério na Terra por um tempo e uma região específica. Ele não teve que pegar nenhum barco pra vir pra Europa fazer isso. Os seus discípulos fizeram, mas ele não. O chamado dele é específico. Então, uma forma de evitar a loucura é a gente não usar a necessidade como critério, porque elas sempre só crescem: você lava dez pratos, aparece vinte; você faz isso aqui, aparece mais, sempre mais, mais, mais, nunca tem, não tem limite esse negócio. Então, é uma pista falsa tentar estabelecer as necessidades como fonte de prioridade pro ministério.
Eu diria que a prioridade, no meio das muitas necessidades, advém desse discernimento de oração, do tempo de silêncio e do aconselhamento com irmãos maiores e os mais experientes. Nessa semana, por exemplo, eu me sentei com os outros pastores da igreja, frente a uma decisão. Eu falei: "Frente a isso, eu orei, me separei um tempo para discernir; em oração, eu discerni essas coisas, por essas realidades. O que é que vocês acham disso?" Eles oraram comigo e disseram: "Faz sentido o que você tá decidindo." Então, pra mim, as três formas de discernir, no meio das necessidades, ao que Deus me chama, é a oração, o tempo de discernimento — a palavra, oração, jejum — e o conselho de irmãos maiores, que me ajudam a focar.
A minha mãe dizia assim: "Quem mira o alvo, erra o resto." Ela dizia: "Foca, foco." Então, no meio das muitas coisas, ao que eu estou chamado? Por isso que é importante a gente olhar pra dentro do coração da gente e perguntar: "O que é que Deus está fazendo comigo agora, nesse momento? Quais são as áreas que Deus tá mexendo no meu coração? Ao que ele tá me chamando nesse momento?" Porque, às vezes, a gente tem boa intenção e a gente gosta de servir, a gente olha necessidade, a gente fica pulando de galho em galho tentando resolver tudo, mas a gente se esgota com esse negócio, a gente põe fogo dos dois lados da vela.
Então, o importante é: no meio das necessidades do teu povo, Senhor, ao que o Senhor me chama? O Ramses diz o seguinte: numa lista de dez coisas, faça as duas primeiras. Ele disse: "Oitenta por cento da satisfação vem de cumprir com vinte por cento da sua lista." Equação de Pareto, não é isso? Ele disse: porque, geralmente, a gente põe a lista de dez coisas e a gente começa lá pra décima, mas não é a prioridade. Vai pra primeira. Então, é muito difícil, mas a gente, com a herança metodista, isso ajuda pra gente, porque o Wesley era bem fera nesse negócio, de aprender a estabelecer o alvo, focar nesse alvo, essa disciplina de focar no alvo.
Então, não transforme a necessidade em geral como critério pra seu discernimento, mas, diante dessas necessidades, pergunte ao Senhor se você é chamado a responder alguma delas. Consulte ao Senhor em oração, na Palavra, e procure conselho de irmãos mais experientes, que vão ouvir você e ajudar. Às vezes, tem coisa que a gente não tá percebendo, que alguém olha pra trás: "Olha, você já pensou nisso?" Puxa, não tinha pensado, que bom, que foi importante esse conselho. Acho que é isso.
— Ah, tá. Ali, tá bom. Eu vou no contraponto do garoto ali, tá bom? Como lidar com o tempo quando você está próximo ao fim, você tá cansado, muitas vezes desanimado, mas a sua mente ainda fala que você pode produzir? Como lidar com isso?
— O cansaço e o desânimo podem vir, podem estar relacionados. Às vezes, quando a gente tá muito cansado, por exemplo, quando a gente tá com fome, nosso sentido de humor muda, não muda? A gente fica impaciente, não é verdade? A gente fica um pouco mais enérgico, assim, ríspido, porque é fome. Então, você se alimenta, aí, como diz o salmo: "Como uma criança saciada no seio de sua mãe, é minha alma para com o Senhor." Então, às vezes, a gente precisa reconhecer: qual é a origem do meu desânimo? E o desânimo pode ser o seguinte: uma sequência de desconsideração do seu limite físico. A gente não descansa adequadamente, e aí a gente se cansa muito, isso abate o nosso emocional, e aí uma coisinha que era desse tamanho fica desse tamanho assim, por causa do nosso cansaço.
Vou dar de novo o exemplo da corrida: se eu vou pra academia hoje de manhã e faço o exercício, puxando ferro e tal, se eu não dormir adequadamente, todo o esforço que eu dei ao meu corpo durante o dia perde tudo. Sabia que, enquanto o nosso corpo descansa, quando a gente dorme, que o corpo processa a informação que recebeu? Então, correr é importante — no meu caso, pode ser futebol pra outros — mas mais importante que correr é saber descansar. Se eu não descansar, não tomar essa bendita água e não me alimentar adequadamente, todo meu desempenho vai pro brejo.
Então, às vezes, o cansaço, o desânimo, é o resultado do descuido do descanso: muita atividade, muito empenho, muito desejo de servir, mas a gente vai desconsiderando os sinais que o corpo vai dando, e o corpo dá sinais pra gente. Eu me lembro de um amigo meu que tava treinando pra essa prova que vai acontecer amanhã lá na África do Sul, em Comrades, e naquele dia, na USP, ele tava correndo 50 km. Ele começou cinco horas da manhã, terminou por volta de onze e meia da manhã, ele correu cinquenta quilômetros. Nós corremos uma parte do trecho com ele. Quando terminou o treino, voltamos pra base, então o treinador falou assim: "Agora você deita aqui, que eu vou te alongar depois, mas, primeiro, você tem que deitar e dormir." Aí ele pegou um colchonete, colocou no chão, ele correu 50 km, os músculos estavam todos tensos assim, e ele deitou e começou a dormir. Nisso que ele começou a dormir, o treinador chamou a gente, e a gente olhando pra perna dele, a perna dava uns espasmos assim, a gente viu aquele ovo subir na perna — era o músculo relaxando por meio do sono. Ele tava relaxando, foi diminuindo a tensão na musculatura. Deu uns vinte minutos dormindo, o treinador falou assim: "Agora você pode acordar, agora eu posso encostar em você. Se eu tentasse alongar você antes, eu ia lesionar você. Agora que o músculo relaxou, eu posso fazer o alongamento."
Então, às vezes, no final da nossa jornada, a gente precisa descansar, sabe? O cansaço, o tanto empenho, o desejo de servir, bem motivado, bem intencionado, leva a gente a um desânimo e ao cansaço. Então, a mente diz: "Eu posso fazer coisas, mas eu não, já não consigo mais." Então, uma das grandes dificuldades que eu tenho todo dia que eu vou treinar é ajustar a minha realidade mental com a realidade física que acontece. Eu chego no Ibirapuera cinco e meia da manhã pra fazer, ah, tem dez quilômetros. Os primeiros dois quilômetros eu largo o pau, no terceiro eu: "Você tem 64 anos, lembrou disso? Acabei de lembrar." Aí eu tenho que ajustar a minha expectativa mental à minha realidade física. Digo: "Eu não devia ter começado assim, eu devia ter começado como corredor de terceira idade, devagarzinho. É devagar, é devagar, é devagarinho", como diz aquele hino evangélico, tá entendendo? Então, aí eu dou aquela respirada e aí vou mais devagarzinho e termino o treino.
Então, a gente que começou cedo, a gente tem uma expectativa mental de que: "Vamos lá, vamos fazer, tá tudo aqui", mas o corpo já não obedece mais. É igual jogar futebol, né? Você vê aqui o lance: "Vou dar três dribles e vou chutar com a perna esquerda." Você pensa que... aí, quando você vai pegar a bola, a bola passa por você, debaixo das tuas pernas, você nem conseguiu levantar o pé pra chutar. Como assim? Né, mas é por isso. Então, a gente tem que ajustar a expectativa com a realidade da gente.
Então, geralmente, o cansaço acumulado no tempo do ministério leva a gente pro desânimo: um humor mais baixo, pouca expectativa. Então, a primeira coisa: pode ser pressão demoníaca ou pressão, pode ser, mas vamos pro mais simples primeiro: tá descansando? Tá dormindo bem? Tá se alimentando? Tá lendo boas coisas? Tá conversando com as pessoas? Tá feliz? Tá tudo feliz? Então, pode ser o cão mesmo aqui, né? Se tiver, vê a sandália, se tiver com a sandália havaiana, a unha fendida, então é o cão, tá entendendo? Mas antes de pensar no cão, vamos pensar na gente, assim: eu acho que eu não tô lidando bem com os meus limites. Aí a gente ajuda, a gente se ajusta um pouco à expectativa da nossa saúde, do cansaço, do descanso, e aí a gente começa a dizer: "Ok, descansado, a gente vem com novas ideias, com novo ânimo, nova disposição."
Então, geralmente — geralmente, tá? Pode ser que não seja assim no caso — mas geralmente, esse desânimo no fim da jornada significa: a gente deu mais do que podia ou estamos desconsiderando a necessidade de descansar. Chama lá os jovens da igreja: "Ó, pessoal, o pastor tá cansado, é o seguinte: nesse mês eu vou pregar um domingo e vou ajudar vocês a prepararem o sermão pra vocês pregarem nesses próximos domingos. Eu sento com você, abro o texto, vamos juntos aqui, eu vou ensinar você a como trabalhar com esse texto, vai lá, eu vou orar por você, você prega, eu vou descansar agora e você vai ouvir o sermão." Você vai dizer assim: "Não é que esse trem fala?" Tá entendendo? É que Deus continua usando as coisas loucas desse mundo, aí um louco acabou de entregar um sermão muito bom, e você descobre uma vocação nova na igreja, tá entendendo? Então, presta atenção no cansaço. Se não, seria bom tirar um final de semana pra dar uma volta aqui no... chama aqui, onde tem as plantas, aqui no Horto Florestal, pescar uma carpinha — pescar não, né? Ver a carpinha lá, com a carpinha na água lá — mas fazer um angu com quiabo, devagarzinho, né?
Geralmente é cansaço. Descansa um pouquinho mais, o ânimo volta.
— Sim. Fala, seu menino.
— Esse aqui tomou formol, né? Nunca muda, é a mesma coisa, né? Que que é isso, rapaz? Só tá ficando branco agora, é, pastor?
— Pensando na nova geração e pensando em pastores que também já estão indo pros finalmente do ministério, vou contextualizar rapidinho o que eu passei: assumi a igreja com vinte e seis anos de idade, lembro que tava muito voltado pra essa perspectiva de que o ministério nasce do ser, que ele flui da sua intimidade, da sua relação, aí vai pra realidade do ministério, pro dia a dia, aí cê chega lá no dia a dia, você percebe que precisa funcionar. Eu lembro que aí eu falei: "Não, preciso estudar." Aí fui estudar. Aí eu lembro que um irmão chegou pra mim e falou assim: "Pastor, eu te vejo como uma Ferrari." "Ferrari?" "Ferrari." "Aí eu: 'Por quê?'" "Cara, cê tem um potencial tremendo, tá? Mas, e aí?" "Aí ele: 'Só tem um problema: a gente não sabe onde liga. A gente não sabe onde liga. Cê foi aqui, cê foi ali, cê estudou, cê fez e tal, e nada, nada vai pra prática aqui, a gente não consegue ver como que isso vai mudar.'" Aí eu fui e comecei a caminhar com aqueles movimentos, como o Mapa, aí a gente foi pra um lado mais pragmático da coisa, aí cê começa a beber, vamos pensar em estrutura, crescimento, organização, treinar e tal, o que que funciona, as formas, as formas, aí cê... aí foi pra esse outro lado. Depois de um bom tempo, aí cê vem, cê fala assim: "Não, isso aqui, isso aqui, cê caminhar desse jeito, daqui mais uns quinze anos não quer nem mais ser pastor." Aí volta de novo pra aquele equilíbrio, né? Como ajudar a nova geração — o cara acabou de assumir a igreja, o cara tem que pensar que o ministério foi dele, mas ele precisa começar a pastorear, ali tem cinco pessoas, revitalizar uma igreja — e também tem aqueles que já estão terminando a carreira, muitos se machucaram na jornada, se feriram, esperaram demais também da estrutura, quando, na verdade, o tempo todo cê tá sinalizando aqui: a pergunta é o que é que Deus quer de mim? O que que Deus tá fazendo em mim? Como ajudar a todo mundo — todo mundo, eu não sei se vai conseguir — mas como ajudar a terminar bem, como vivenciar corretamente cada uma dessas etapas? Hoje eu, nessa posição de ajudar a formar, como contribuir pra isso, quais passos seriam relevantes? Porque a gente vê que tem muitos movimentos, tem um movimento Cajados, do André Fontana, tem um senhor que tem esse conhecimento, essa experiência que passa no seminário, mas no dia a dia, o que que cê recomendaria, até mesmo institucionalmente falando?
— A gente tem uma mente muito pragmática, né? A questão do desempenho é forte, né? Muito tempo atrás, eu e mais um amigo estávamos escrevendo um livro sobre a sociologia das teologias de crescimento de igreja. A gente resolveu parar de escrever, porque a gente ia ter que comprar passagem só de ida fora do Brasil, nem poder voltar depois. Quando, em Jerusalém, a perseguição produz a morte de Estevão, e os crentes saem em direção ao norte, enquanto saem, eles vão evangelizando e chegam até Antioquia, e nasce uma igreja em Antioquia. Os irmãos em Jerusalém ouvem falar da igreja em Antioquia e enviam Barnabé pra lá. Então, Lucas escreve isso em Atos, esse momento, e o texto diz assim que Barnabé, chegando em Antioquia, viu a mão de Deus entre eles, se alegrou e encorajou os irmãos. Barnabé não disse, quando chegou lá em Antioquia: "Irmãos, eu vim aqui de Jerusalém, trouxe pra vocês a receita: Jerusalém com propósito. Se vocês aplicarem aqui os dez passos de Jerusalém, essa igreja em Antioquia vai detonar, tá voando." O texto diz que Barnabé chegou em Antioquia e viu a mão de Deus entre eles.
Então, o nosso primeiro chamado não é comparar, é reconhecer quais são os sinais da graça de Deus no meio do povo. O problema das fórmulas é que elas congelam um período da igreja e transformam aquele período como se fosse uma receita pra todas as igrejas. Eu fico feliz de ler "Jerusalém com Propósito", "Antioquia com Propósito", ou as "Nove Marcas de Jerusalém", qualquer coisa. Eu fico feliz quando eu vejo isso, eu digo assim: que bom que Deus fez essa obra lá, mas isso não quer dizer que isso é uma fórmula pra mim aqui. Eles não sabem porque o mutu chora, eu sei.
Eu tava trabalhando no Canadá, em Toronto, eu tava na casa do presidente da Convenção Batista canadense, eu com mais um amigo meu da Alemanha, o Martin Reisman. No café da manhã, ele falou assim: "Zé, eu posso fazer uma pergunta pra você?" Eu falei: "Pode, por que não?" "Eu tô tendo um problema com missionários brasileiros aqui no Canadá." Falei: "Ah, é? Qual o problema?" "Eles trouxeram pra cá aquele livro 'Crescimento Natural da Igreja' e tão aplicando aqui entre portugueses no Canadá." Aí o meu amigo Martin Reisman falou assim: "Eu conheço o autor, ele é alemão, isso tá em português? Olha aqui a loucura: um livro escrito por um teólogo alemão — que é um bom livro, por sinal, respondendo às necessidades da igreja no seu contexto — é traduzido pro português, missionários brasileiros pegam o livro, vão pro Canadá pra trabalhar com portugueses. O componente da tradução: esse perigo da tradução. Quando você desconsidera o elemento cultural, cê pode aplicar soluções que não se adequam àquele outro contexto, porque é uma obra traduzida, é uma outra realidade."
Então, eu diria assim: o básico é Bíblia, oração e igreja, ponto. Esse é o básico. O que muda as pessoas é Bíblia, oração e igreja, é isso. Culto de quarta-feira, oração, entendeu? Oração do coque, do poder, esse negócio todo, é isso que muda. Aí a gente chega na igreja, a gente pergunta assim: "Senhor, o que é que o Senhor está fazendo aqui? Quais são os sinais da tua obra aqui?" E a gente coopera com aquilo que Deus está fazendo, a gente encoraja a igreja, a gente não vem com uma fórmula externa e mete de goela abaixo na igreja, porque essa fórmula é um perigo, gente. A gente diz assim: "Até agora, eu que tava falando, mas com essa fórmula é Deus que vai falar." Sério? Sério mesmo? O pastor tá pregando aqui há trinta anos, com a sua limitação, buscando a Deus, abrindo a Bíblia, ensinando a igreja, agora que ele descobriu uma fórmula num congresso tal, que ele foi naquele congresso, comprou uma fórmula, comprou o vídeo, comprou o livro, comprou as lições, essa é a solução? Não. Isso serve como inspiração, mas não como panaceia. Como inspiração: que bom que Deus fez nessa cidade isso, Deus é bom, Ele pode fazer na nossa cidade também, isso e outras coisas mais. Mas a gente não impõe modelos, a gente adapta, a gente primeiro faz a pergunta: "Antes de eu chegar aqui, Deus já tava aqui, a Bíblia tava sendo aberta, o evangelho tava sendo anunciado. Quais são os sinais da presença de Deus aqui?"
Então, essa cultura das fórmulas é nociva nesse sentido, ao meu modo de ver, porque ela não reconhece o ministério que já tá sendo feito e corre o risco de querer impor. Eu já vi muitas pessoas aqui — não aqui, mas no Brasil, né — serem mandadas da igreja, sendo um pastor fiel, esposo de uma só mulher, educando bem os filhos, mas porque não tava na visão. Como assim? Qual visão que ele tava? "Ah, não, porque a gente aplicou aqui uma visão do XPTO quarenta e cinco megahertz, essa é a visão, agora todo mundo tem que estar nessa visão, se não tiver na visão, tá fora." Sério? Qual é a base pra essa abordagem?
Então, eu diria: leia todo livro sobre crescimento de igreja como modelo de inspiração, como testemunho, pra alegrar o seu coração, pra dizer: "Senhor, faz de novo." Wesley, né? Um Billy Graham lá no quarto de oração de Wesley: "Senhor, faz de novo, faz de novo." Não diz: "Faz igual", é "faz de novo". Então, a gente tem que ir lá, ouvir, dizer: "Que beleza, que coisa boa tá acontecendo lá, Senhor, agora eu tô aqui em João Pedra das Couves, o que o Senhor tá fazendo aqui? Como é que eu reconheço a tua presença aqui, a tua ação aqui?" Então, tô dizendo assim: leia esses livros ou preste atenção nesses modelos como inspiração, mas não imponha sobre a sua realidade como fórmula, né? Aprender o que Deus tá fazendo.
Conto uma história pra terminar: um amigo não cristão veio me procurar dizendo: "Zé, você tá na igreja?" Eu falei: "Não, tô em casa." "Você pode ir pra igreja?" "Por quê?" "Porque eu quero conversar com você, mas tem que ser na igreja." Eu falei: "Tá bom, né? Vai confessar pecado, alguma coisa assim." Lá fui eu pra igreja, sentou: "Ah, cara, fiz bobagem no meu casamento, assim, assim, assim, assim." Falei: "Ó, cê tá numa igreja, falando com o pastor, sinto muito, cê vai ouvir o evangelho, vou te ensinar sobre Jesus, sobre o perdão de Jesus." Aí ele disse: "Mas eu não sou cristão." Falei: "Não quero saber, chamou o pastor na igreja, meu amigo, pediu, né? Toma-lhe evangelho, cê vai se comprometer com isso." "Eu vou, vou, eu te ajudo, mas vai." Tá bom.
Aí, tempos depois, a esposa me chama, fala: "Zé, você conversou com aquele miserável?" "Conversei." "Ele foi falar com você?" "Foi." "O que que cê fez?" "Falei de Jesus pra ele." "Cê pode me visitar?" "Posso." Cheguei lá: "Vim falar de Jesus pra você." "Mas não..." "Não, cê chamou um pastor, você vai ouvir de Jesus, vou falar sobre o perdão de Jesus, você vai se comprometer com isso." Aí vai lá, dois não cristãos ouviram sobre perdão de Jesus, se comprometeram. Passaram uns quatro meses, eu tô no Ibirapuera, eu vejo ele correndo na minha direção, ele vem mais veloz, chega, me abraça, chorando, e diz: "Você salvou a minha vida." Falei: "Eu? Não, miserável, Jesus." Daqui a pouco vem a esposa dele: "Muito obrigado." Falei: "Já sei o motivo desse choro, a gente vai fazer uma lua de mel nova agora, que maravilha." Eu falei: "Eu preciso de mais incrédulos como vocês na minha igreja, que aplicam o evangelho. É mais fácil lidar com um incrédulo que aplica o evangelho do que com um crente que não quer." Tá entendendo? Porque leva a sério o evangelho, e esse negócio é sério, é poder de Deus mesmo pra esse negócio.
Então, não tava na igreja, não era crente, mas eu reconheci que Deus tava agindo naquela vida ali. Agora, se eu fosse fazer as fórmulas: "Cê vem pra minha igreja, faz dez cursos sobre batismo, dá três meses de dízimo crescente, vai nas águas, toma três ceias, depois eu venho pra restaurar..." Tá entendendo o que eu quero dizer da fórmula? Não, gente. Do Senhor é a terra e tudo que nela há, né? Então, quais são os sinais da ação de Deus em nosso meio? A gente reconhece, acho que é por aqui.
E a gente vai, no final do dia, é Bíblia, oração e igreja, pronto. Esse é o triângulo das bermudas, pra usar aqui, é o que a gente precisa na dieta, né? É isso: Bíblia, oração e igreja. Tá bom, gente? Obrigado, obrigado, obrigado, gente, obrigado! Eu falei muito, eu nem olhei pro relógio para não ficar com culpa. Deixa eu só mostrar pra vocês os livros que podem ajudar vocês sobre essa questão de transição: o Bob Buford, "A Arte de Virar o Jogo no Segundo Tempo da Vida", é um livro muito bom, da Editora Mundo Cristão. Ele fala sobre a primeira metade da nossa vida, a gente fica muito focado no sucesso; na segunda metade, no significado. Como é que a gente muda de sucesso pra significado? É um livro excelente pra isso.
Do David Yonggi Cho, "Liderando a Transição", também é um ótimo, excelente livro, do Instituto Hagai. Esse material, dele também, eu não achei em português, mas tem em inglês, que é "Terminando Bem" ("Finish Well"), um excelente livro dele também, que vocês podem... Do Bob Buford tem esse aqui, é... depois do... o livro seguinte que ele escreveu depois de "Virando a Segunda Metade da Vida" ("Half Time"), é "Além do Segundo Tempo da Vida". Esse tá em inglês, mas é muito bom.
Livros que não são cristãos, mas que ajudam a gente a repensar o nosso uso do tempo, aquele negócio de reduzir, simplificar e renunciar: esse aqui eu gostei demais, "O Essencialismo", do Greg McKeown. Então, ele diz: "A disciplina da busca por menos." Ele é minimalista, né? Então, ele ensina, tem um capítulo inteirinho sobre como dizer não — sensacional esse capítulo, né? Você não pode deixar de ler esse capítulo sobre como dizer não, porque é muito bom esse capítulo aqui, tá bom?
É isso, gente. Obrigado, obrigado, obrigado!
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