Desmascarando os Erros da Teologia da Prosperidade na Interpretação de Isaías 53
Por Bispo Ildo MelloApoiados em passagens como Isaías 53.4–5, os adeptos da Teologia da Prosperidade defendem a promessa de cura física plena nesta vida. Entretanto, é fundamental examinar o texto cuidadosamente, tanto em seu contexto imediato quanto à luz do conjunto das Escrituras, para verificar se essa leitura realmente se sustenta.
1. “Nossas Enfermidades” no Contexto de Isaías
Em Isaías 53, o profeta descreve o Servo Sofredor (cumprido em Cristo), que toma sobre si não apenas o pecado da humanidade, mas também as consequências da queda, abrangendo aspectos espirituais, físicos e emocionais.
Ênfase Espiritual:
O capítulo 1 de Isaías compara o povo pecador a um corpo enfermo, aludindo a uma realidade espiritual:“Toda a cabeça está doente, e todo o coração está enfermo. Desde a planta do pé até a cabeça não há nada são, mas feridas, contusões e chagas abertas...” (Is 1.5–6).
Nesse contexto, “enfermidade” simboliza rebeldia, corrupção moral e separação de Deus. Por isso, quando Isaías 53.4 fala em “nossas enfermidades”, a profecia certamente inclui o problema do pecado e sua barreira espiritual, que afeta o relacionamento humano com o Criador. É nesse sentido que Pedro cita esse texto aplicando-o à libertação do pecado:
“Ele mesmo levou os nossos pecados em seu corpo sobre o madeiro, para que, tendo morrido para os pecados, vivamos para a justiça; pelas suas feridas vocês foram curados” (1Pe 2.24).
Dimensão Física:
Ao mesmo tempo, a palavra “enfermidades” em Isaías 53 não exclui o sentido literal. O resultado do pecado no mundo também engloba doenças e sofrimentos físicos. Portanto, a linguagem de Isaías 53 pode abarcar tanto a cura do coração pecador quanto suas repercussões externas (doenças, dores, sofrimento).O Evangelho de Mateus mostra que Jesus cumpriu Isaías 53.4 em seu ministério terreno ao curar a sogra de Pedro:
“Assim se cumpriu o que fora dito pelo profeta Isaías: ‘Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e levou as nossas doenças’.” (Mt 8.14–17)
Aqui se vê que a expressão de Isaías 53 se aplica às curas realizadas por Jesus, demonstrando Seu poder sobre doenças físicas. Ainda assim, o cumprimento final dessa profecia — a restauração completa da criação — ocorrerá apenas na consumação dos séculos, quando “Ele enxugará de seus olhos toda lágrima [...]; não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem dor” (Ap 21.4).
2. Entre o “já” e o “ainda não”
Ao interpretar Isaías 53.4–5 como se o cristão tivesse, nesta vida, um direito inquestionável à cura, a Teologia da Prosperidade ignora o aspecto escatológico que equilibra a perspectiva bíblica. É verdade que Cristo inaugurou o Reino de Deus e manifestou seu poder curador em seu ministério terreno; contudo, a experiência completa de restauração só será consumada na eternidade.Já:
Cristo inaugurou o Reino de Deus e demonstrou Seu poder curador durante o ministério terreno. Ainda hoje, podemos vivenciar curas divinas, conforme a vontade soberana de Deus. Tais curas são sinais do Reino, as “primícias” de uma realidade ainda não plenamente manifestada.Ainda não:
Embora possamos experimentar curas, permanecemos sujeitos a doenças, dores e, por fim, à morte, pois ainda gememos, aguardando a redenção completa de nosso corpo, que segue mortal e corruptível (cf. Rm 8.22–23). Vivemos em uma condição de peregrinação, com limitações físicas que culminam na morte — afinal, ninguém morre de “saúde”; toda morte implica a falência de algum aspecto do organismo.Essa tensão entre o “já” e o “ainda não” evidencia que, apesar de Deus operar curas em nossa jornada, a restauração completa do corpo só se consumará na glorificação futura, quando “o que é corruptível se revestirá de incorruptibilidade” (1Co 15.53–54).
3. O Erro de Ignorar que Mesmo Servos Fiéis Padecem Enfermidades
As Escrituras mostram que os cristãos continuam a enfrentar sofrimentos (cf. Fp 1.29; 2Tm 3.12), incluindo doenças. O próprio apóstolo Paulo lidou com um “espinho na carne” que não lhe foi removido, apesar de suas orações (cf. 2Co 12.7–9). Além disso:Timóteo tinha enfermidades frequentes; em vez de recomendar apenas “mais fé”, Paulo aconselhou um remédio prático (um pouco de vinho) para fins medicinais (cf. 1Tm 5.23).
Epafrodito quase morreu em decorrência de uma doença (cf. Fp 2.27).
Trófimo foi deixado enfermo em Mileto (cf. 2Tm 4.20).
Esses exemplos deixam claro que a cura física não é garantida de forma contínua a todos os cristãos. Deus pode curar, mas o faz segundo Sua soberania e propósito. A promessa de cura plena — sem enfermidade nem morte — só será cumprida na ressurreição final, quando Cristo consumar Seu Reino.
Conclusão
Isaías 53.4–5 apresenta uma profecia abrangente, que envolve a redenção do pecado e de todas as suas consequências, tanto no âmbito espiritual quanto no físico. O ministério terreno de Jesus já apontou para essa restauração ao curar enfermos e perdoar pecados, mas a plenitude só será atingida na nova criação, quando todo sofrimento for removido (cf. Ap 21.4).Por isso, é incorreto usar Isaías 53 como garantia de que o crente jamais ficará doente neste mundo. O testemunho das Escrituras e a experiência cristã mostram que continuamos expostos à realidade de um mundo caído até a volta de Cristo. Devemos, portanto, anunciar a esperança bíblica de que, embora sejamos sujeitos à dor nesta vida, temos a promessa segura de que seremos finalmente libertos de toda aflição na consumação do Reino de Deus, quando será destruído o último inimigo, a saber, a morte (cf. 1Co 15.26).
Até lá, podemos desfrutar as “primícias do Espírito” (Rm 8.23) e a certeza de que nada poderá nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm 8.38–39).
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