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Um contraste entre as distintas espécies de fé que não salvam e a fé salvadora

É comum ouvirmos frases do tipo: “O importante é ter fé”, como se a fé tivesse valor por si só, não importando a qualidade e o objeto da fé, algo que vai na toada daquela famosa canção de Gilberto Gil que diz: “andar com fé eu vou, pois a fé não costuma falhar”. Paralelo a isto, temos também as seguintes ideias: “O importante é ter uma religião” e “todo caminho leva a Deus, o importante é ser sincero”. Mas, como diz certa canção, “se pegar a estrada do Rio pra Salvador, Porto Alegre não verás, mesmo que sincero for.” Que tal examinarmos melhor esta questão à luz do ensino do Senhor Jesus Cristo e seus apóstolos?

Quando Jesus exalta a virtude da fé, Ele o faz no contexto bíblico, cujo objeto desta fé é o único e soberano Deus e em seu Filho Jesus Cristo, que é o caminho, a verdade e a vida (Mt 21.21; Lc 17.6; Jo 14.1-6). E sempre que Jesus disse a alguém; “a tua fé te salvou”, estava implícito que se tratava de uma fé na pessoa de Cristo (Mt 9.22; Mc 5.34; 10.52; Lc 7.50; 8.48; 17.19; 18.42).

Exemplos de fé que não salvam:


  1. fé em falsos deuses ou naquilo que não pode salvar. “Sabeis que, outrora, quando éreis gentios, deixáveis conduzir-vos aos ídolos mudos, b segundo éreis guiados.” (1Co 12.2). “… deixando os ídolos, vos convertestes a Deus, para servirdes o Deus vivo e verdadeiro” (1Ts1.9); “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos.” (1Jo 5.21).
  2. fé em falsos ensinos “… darem crédito à mentira”(2Ts 2.11); “para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro. (Ef 4.14); “Assim como, no meio do povo, surgiram falsos profetas, assim também haverá entre vós falsos mestres, os quais introduzirão, dissimuladamente, heresias destruidoras, até ao ponto de renegarem o Soberano Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição.” (2Pe 2.1).
  3. fé superficial e temporária, que não resiste as provações - semente que caiu em solo rochoso (Mt 13.20–21). No momento mais difícil de sua provação, Jó exclamou: “eu sei que o meu Redentor vive e por fim se levantará sobre a terra. (Jó 19.25); e, semelhantemente, Habacuque, declarou: “Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; o produto da oliveira minta, e os campos não produzam mantimento; as ovelhas sejam arrebatadas do aprisco, e nos currais não haja gado, todavia, eu me alegro no SENHOR, exulto no Deus da minha salvação.” (Hc 3.17–18).
  4. fé sentimental ou circunstancial, naquilo que se pode ver ou sentir. “Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não vêem.” (Hb 11.1); “Porque, na esperança, fomos salvos. Ora, esperança que se vê não é esperança; pois o que alguém vê, como o espera?Mas, se esperamos o que não vemos, com paciência o aguardamos.” (Rm 8.24–25); “não atentando nós nas coisas que se vêem, mas nas que se não vêem; porque as que se vêem são temporais, e as que se não vêem são eternas.”(2Co 4.18); “todavia, o meu justo viverá pela fé”(Hb 10.38).
  5. fé hipócrita - “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos, naquele dia, q hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade.” (Mt 7.16–23).
  6. fé intelectual, sem coração, sem amor, sem obediência, sem obras. Este tipo de fé até os demônios possuem (Tg 2:19). “Meus irmãos, qual é o proveito, se alguém disser que tem fé, mas não tiver obras? Pode, acaso, semelhante fé salvá-lo?… a fé, se não tiver obras, por si só está morta.” (Tg 2.14 e 17). A salvação não se dá através das obras, mas, unicamente pela fé no Salvador Jesus Cristo. Mas a fé em Cristo não pode ser inoperante, pois precisa ser uma fé viva que “atua pelo amor” (Gl 5.6) e que nos conduz as boas obras que Deus preparou de antemão para que andássemos nelas (Ef 2.8-10). A fé salvadora produz os devidos frutos do Espírito. Tiago disse que a fé sem obras é morta. João falou que aquele que diz ter fé em Deus, mas não ama, não conhece a Deus, pois Deus é amor. E Paulo falou que fé sem amor é sem valor e disse que o que importa é a fé que opera pelo amor (Gl 5.6), pois fomos salvos pela fé para as boas obras (Ef 2.10). E Jesus disse: “Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama; s e aquele que me ama será amado por meu Pai, e eu também o amarei e me manifestarei a ele.” (Jo 14.21).


Como crer, receber e aceitar a Cristo?

É comum ouvirmos apelos para as pessoas receberem e aceitarem a Cristo, baseados em João 1.12 que diz: "Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que crêem no seu nome”. Mas acontece que existem muitas pessoas que não recebem a Cristo e nem creem nele de maneira apropriada. Encontramos alguns exemplos disto no Novo Testamento:

Formas erradas de crer e receber a Cristo


  1. Por ocasião do seu primeiro milagre, muitos creram em seu nome, mas Jesus parece não ter ficado satisfeito com a espécie de fé deles, pois é dito: “mas o próprio Jesus não se confiava a eles, porque os conhecia a todos. (Jo 2.24).
  2. Nicodemos e muitas autoridades que creram, mas tinham vergonha de confessar sua fé em Cristo publicamente para não perderem seu status social e religioso (Jo 3.1-2 e Jo 12.42; Mt 10.33).
  3. Quando da primeira multiplicação de pães e peixes, a multidão quis receber a Jesus como rei, mas Jesus se retirou entristecido por perceber que eles só o procuravam por causa do pão que perece (Jo 6.15).
  4. Os próprios irmãos de Jesus, a princípio, apenas o reconheceram e o receberam como um operador de milagres, mas não o reconheciam como Messias e Salvador (Jo 7.5).
  5. Simão, o mágico, mostrou-se ávido a receber o dom do Espírito Santo, oferecendo até dinheiro para também receber poder de transmiti-lo, mas, Pedro, percebendo suas reais motivações, lhe respondeu: “teu dinheiro seja contigo para perdição, pois julgaste adquirir, por meio dele, o dom de Deus.” (At 8.20).
  6. O fariseu recebeu a Jesus em sua casa, mas o fez de maneira qualquer, sem a devida honra. (Lc 7.36-46).
  7. Nove leprosos que foram curados por Jesus e nem sequer se deram ao trabalho de regressar para agradecê-lo (Lc 17.11-19).
  8. Não devemos receber a Cristo como um bilhete para escaparmos do inferno e irmos para o céu. Jesus é melhor do que o céu. Na verdade, é Ele quem faz o céu ser céu! Não haverá sol e nem candeia na Nova Jerusalém, pois Jesus será a luz desta cidade celestial! (Ap 21.23). O fato mais admirável da vida porvir é que seremos capazes de vê-lo como ele realmente é! (1Jo 3.2). Precisaremos realmente de toda a eternidade para poder apreciar e conhecer a grandeza e a glória de Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo!
  9. Não devemos receber a Cristo como um certificado de salvação, mas como o caminho da salvação. A salvação não é algo estático, mas dinâmico. Devemos seguir seus passos. Ele é o caminho e a vida! Salvação é relacionamento de profunda e verdadeira amizade, é caminhar com Cristo e aprender a viver com ele. Não há salvação fora de Cristo. Ele é a vida eterna!


Formas apropriadas de crer e receber a Cristo


  1. Como a pessoa que, “tendo achado uma pérola de grande valor, vende tudo o que possui e a compra. (Mt 13.46).
  2. Com a alegria e o desprendimento da pessoa que encontrou o tesouro mais precioso do mundo: “O reino dos céus é semelhante a um tesouro oculto no campo, o qual certo homem, tendo-o achado, escondeu. E, transbordante de alegria, vai, vende tudo o que tem e compra aquele campo” (Mt 13.44).
  3. Com a fé que nos leva a buscar o Reino de Deus em primeiro lugar (Mt 6.33) e a priorizar o chamado em detrimento dos nossos projetos pessoais: “Então, convocando a multidão e juntamente os seus discípulos, disse-lhes: Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me.” (Mc 8.34).
  4. Como os discípulos que abandonaram as redes (Mc 1.16-20), a coletoria de impostos (Mc12.14) e que tudo foram capazes de deixar para trás a fim de seguir a Cristo (Mc 10.28-30).
  5. Paulo que considerou tudo como refugo para ganhar a Cristo (Fp 3.8).
  6. Como a pessoa mais amada e querida do mundo: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim não é digno de mim” (Mt 10.37).
  7. Como Zaqueu que recebeu a Jesus com alegria, obedeceu o seu comando e espontaneamente decidiu doar metade de seus bens aos pobres e ressarcir quadruplamente a todos a quem havia causado prejuízos (Lc 19.1-8).
  8. Como a Mulher Samaritana que, maravilhada, confessou sua fé em Cristo, e trouxe uma multidão de vizinhos para conhecê-lo (Jo 4). Pois, “se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Porque com o coração se crê para justiça e com a boca se confessa a respeito da salvação.” (Rm 10.9–10).
  9. Como a mulher pecadora que, ao contrário do fariseu que fez pouco caso de Cristo, honrou a Jesus, chorando aos seus pés, regava-os com suas lágrimas e os enxugava com os próprios cabelos; e beijava-lhe os pés e os ungia com o ungüento. (Lc 7.38).
  10. Como aquela mulher que veio “trazendo um vaso de alabastro e com preciosíssimo perfume de nardo puro; e, quebrando o alabastro, derramou o bálsamo sobre a cabeça de Jesus.” (Mc 14.3).
  11. Com gratidão e devoção daquele único leproso dos dez que foram curados e que regressou para agradecer e adorar a Jesus: “Um dos dez, vendo que fora curado, voltou, dando glória a Deus em alta voz, e prostrou-se com o rosto em terra aos pés de Jesus, agradecendo-lhe; e este era samaritano.” (Lc 17.15–16). Este ouvirá de Cristo: “Levanta-te e vai; a tua fé te salvou.” (Lc 17.19).
  12. Devemos receber e confiar no Salvador, assim como aqueles meninos que estavam presos e sem saída naquela profunda caverna da Tailândia confiaram nos mergulhadores que foram salvá-los. Eles precisaram reconhecer que estavam perdidos e que não havia qualquer outro meio de salvação. Precisaram confiar na competência dos mergulhadores. Mas, não bastava apenas acreditarem, precisavam dar um passo de fé, precisavam se entregar totalmente nas mãos de seus salvadores para serem salvos. Assim também devemos confiar totalmente nossa vida nas mãos do Salvador.


Conclusão

A fé, pura e simplesmente, não salva. Para obtermos salvação precisamos depositar fé e confiança no único meio de salvação, pois “não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos” (At 4.12). Esta fé não pode ser superficial, nem circunstancial, nem inoperante e infrutífera. Precisa ser uma fé viva que nos reconcilia com Deus, que nos faz beber do seu amor, da sua graça e da sua misericórdia. Isto é suficiente para impactar todo o curso de nossa vida. Tal fé produzirá muitos frutos, muitas boas obras para a glória de Deus. (Mt 5.16).

Cristãos que não produzem os frutos do Espírito e que não praticam boas obras não tem base bíblica para estarem seguros de sua salvação. Algo deve estar errado com sua fé e com seu relacionamento com Cristo, pois Ele mesmo disse: “Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto” (Jo 15.5). Quem recebeu também perdão, precisa tornar-se perdoador sob o risco de ter o perdão cancelado (Mt 18.23-35; Mt 6.14-15). Quem foi tão amado, deve também amar (1Jo 4.11). “Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor.” (1Jo 4.8). “O amor não pratica o mal contra o próximo; de sorte que o cumprimento da lei é o amor.” (Rm 13.10).

Quando recebemos a Cristo como a pérola de inestimável valor, tudo mais passa a ter valor secundário. Os atos sacrificiais se tornam naturais e espontâneos. Jesus se torna nosso maior amor, nossa maior alegria e satisfação. Seu mandamentos se tornam fáceis (1Jo 5.3) e seu jugo passa a ser suave e o seu farde, leve (Mt 11.30). Quando estamos apaixonados, não medimos esforços para agradar a pessoa amada e para estar ao seu lado. Caso contrário, tudo se torna difícil e tedioso.

Bispo José Ildo Swartele de Mello

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