A Prioridade do Cônjuge na Constituição Familiar
Por Bispo Ildo Mello
Por que o casamento deve ter primazia sobre todos os outros vínculos familiares, inclusive com pais e filhos
Introdução
Vivemos em uma cultura onde os papéis familiares estão confusos. Por isso, é fundamental reafirmarmos os princípios que Deus estabeleceu para o lar. De acordo com as Escrituras, o casamento é a base da família, e a relação conjugal deve ser a prioridade máxima entre todos os relacionamentos humanos — sim, inclusive em relação aos pais e filhos.
Essa afirmação pode gerar dúvidas: o que significa "deixar pai e mãe"? A Bíblia estaria ensinando que devemos abandonar nossos pais? Absolutamente não. O que as Escrituras propõem é uma reorganização de prioridades, não abandono ou negligência.
Vamos examinar essa verdade de forma clara e pastoral.
1. O que realmente significa "deixar pai e mãe"?
O texto fundamental está em Gênesis:
"Por isso, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne"* (Gn 2.24, NAA).
Esta passagem não ordena o abandono dos pais nem quebra o mandamento de honrá-los (Êx 20.12). O termo "deixar" se refere à *transferência da centralidade* do vínculo familiar. Ou seja:
- Deixar não é abandonar, mas reorganizar prioridades
- Não é desonrar os pais, mas honrá-los de forma madura a partir de um novo núcleo familiar
- É sair da dependência para assumir responsabilidade
O casamento marca o início de um novo lar, com nova autoridade espiritual, afetiva e prática. A relação com os pais continua, mas deixa de ser o eixo principal da vida. O casal assume juntos um novo compromisso que exige exclusividade, aliança e prioridade.
2. Um vínculo único: "uma só carne"
Quando se casam, marido e esposa se tornam, segundo Jesus, "uma só carne" (Mt 19.6). Esta é a união mais profunda possível entre dois seres humanos. Nenhuma outra relação é descrita nesses termos — nem mesmo entre pais e filhos.
Por isso, o relacionamento conjugal deve ocupar o primeiro lugar entre todos os afetos humanos. Isso significa priorizar o cônjuge:
- Acima dos pais — porque uma nova família está sendo formada
- Acima dos filhos — porque os filhos são fruto do amor conjugal e precisam da unidade dos pais para se sentirem seguros
Quando negligenciamos essa ordem de prioridades, criamos confusão, tensão e enfraquecemos a estrutura do lar.
3. Priorizar o cônjuge também abençoa os pais
Muitas pessoas resistem à ideia de que o cônjuge deve vir antes dos pais porque associam isso à ingratidão. Mas quando um filho ou filha deixa o lar para construir um casamento saudável, isso na verdade traz alegria e tranquilidade aos próprios pais.
Pais verdadeiramente amorosos não querem manter os filhos emocionalmente dependentes. Eles desejam vê-los amadurecendo e formando lares estáveis, cheios de amor e temor a Deus. Um casamento sólido é motivo de orgulho para os pais e pode se tornar um ponto de apoio futuro em sua velhice, como ensina 1 Timóteo 5.4:
"Aprendam primeiro a exercer piedade para com a própria família e a recompensar seus pais, pois isto é agradável diante de Deus."
Portanto, "deixar pai e mãe" no casamento faz parte do processo natural de amadurecimento. Isso não exclui cuidar deles com carinho, gratidão e responsabilidade, especialmente quando mais precisarem.
4. O bem dos filhos depende da prioridade conjugal
Aqui está um erro comum: muitos casais, mesmo entendendo que os pais não devem ser prioridade, acabam colocando os filhos nesse lugar central. Quando os filhos se tornam o centro do lar e o relacionamento conjugal é negligenciado, todos saem perdendo:
- O casal se distancia emocionalmente
- A intimidade é abandonada
- Os filhos crescem com uma visão distorcida de amor, limites e autoridade
A melhor forma de amar os filhos é oferecer-lhes pais que se amam.** A unidade conjugal proporciona às crianças:
- Segurança emocional
- Estabilidade espiritual
- Um modelo saudável de masculinidade e feminilidade
5. A ordem divina fortalece toda a família
Seguir o princípio bíblico da prioridade conjugal não destrói os outros laços familiares — pelo contrário, os fortalece. Quando marido e esposa vivem em aliança, diálogo e harmonia, toda a família prospera. Os pais são honrados com maturidade, os filhos crescem em ambiente seguro, e Deus é glorificado.
Ignorar essa ordem gera lares desestruturados, conflitos entre gerações e filhos inseguros. Obedecê-la, por outro lado, produz bênçãos duradouras.
Conclusão
O cônjuge deve ser a pessoa mais importante no contexto familiar — esta é a ordem estabelecida por Deus. Isso não significa abandonar os pais nem desprezar os filhos, mas colocar cada relacionamento em seu devido lugar.
No casamento, um novo vínculo é formado — "uma só carne" — que exige prioridade exclusiva, cuidado mútuo e compromisso de vida. Quando o cônjuge é priorizado, os pais se alegram, os filhos se sentem seguros, e o lar se torna um reflexo da vontade de Deus.
Que cada cristão compreenda e viva essa verdade com sabedoria, honra e amor — para a glória de Deus e edificação de sua casa.
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